'Batalhão da Propina' arrecadava até R$ 1 milhão por mês de traficantes
Como funcionava o esquema Arte: O Dia
Único delator disse que 'não tinha como ninguém dizer que não
sabia da propina' no batalhão de São Gonçalo
ADRIANA CRUZ, GUILHERME SANTOS E MARIA INEZ
MAGALHÃES
Rio - ‘Contratado’ pelos policiais militares do 7º
BPM (São Gonçalo) só para recolher R$ 1 milhão, por mês, de traficantes de 41
comunidades do município, o único delator do esquema de corrupção revelou em
depoimento à Polícia Civil ao qual O DIA teve acesso que “não tinha
como ninguém dizer que não sabia da propina”, referindo-se à unidade. Ele
rejeitou proposta para ‘servir’ aos PMs do 12ª BPM (Niterói), por falta de
tempo. Segundo a investigação, ele recebia R$ 6.400 mensais atuando como elo
entre o tráfico e oito grupos de policiais, sendo R$ 800 de cada um.
As declarações do colaborador resultaram ontem na
deflagração da Operação Calabar da Polícia Civil, a maior da história do
estado, para prender 96 militares, que vendiam drogas e até armas para os
bandidos, e 76 traficantes. O nome da operação é referência ao traidor
português Domingos Fernandes Calabar.
Como funcionava o esquemaArte: O Dia
Nenhum oficial foi preso, mas as investigações
continuam. A operação começou por volta das 4h de ontem. Para capturar todo o
grupo, a Delegacia de Homicídios de Niterói, ltaboraí e São Gonçalo,
responsável pelas investigações, reuniu 600 policiais civis, entre eles, 115
delegados, com apoio da Corregedoria da PM e Ministério Público.
“A pessoa tem distintivo e às vezes está até matando
um colega de profissão, está dando apoio a um traficante que está matando um
outro colega dele de farda”, afirmou o governador Luiz Fernando Pezão,
acrescentando que, na crise, os policiais recebem primeiro.
Daniel Soares e Renato Tardin são apontados como
homens que recolhiam dinheiro para os policiaisRommel Pinto / Parceiros /
Agência O Dia
Ao delatar o esquema, o ‘contratado’ — que contava
com mais três recolhedores presos ontem, um deles usava farda e arma da PM —
forneceu números de telefones ‘buchas’, ou seja, que não estavam em nome dos
integrantes do bando, mas eram usados para negociar a propina entre 2014 e
2016. Gravações telefônicas foram autorizadas pela 2ª Vara Criminal de São
Gonçalo.
Perícia de especialistas do Ministério Público
identificou acusados até pelas vozes. Segundo o colaborador, a distribuição do
dinheiro era feita em patamos, no batalhão e até pela janela de DPO. Policiais
que não faziam parte do esquema e invadiam comunidades eram punidos por
oficiais da unidade.
Delegacia foi 'assaltada'
Durante as investigações, no dia 21 de março, a
Delegacia de Homicídios de Niterói, Itaboraí e São Gonçalo foi invadida por
bandidos em busca de provas que corroboravam a operação Calabar. Agentes da
unidade também são investigados para saber se houve facilitação para ação dos
criminosos.
Polícia fez megaoperação para prender 96 PMs.
Militares lotados no 7º BPM (São Gonçalo) entre 2014 e 2016 são acusados de
receber propina, além de venda de armasFoto: Estefan Radovicz / Agência O Dia
Segundo o delegado Marcus Amin, o alvo foi a sala
onde estavam guardados seis celulares em um saco com o número do procedimento,
que foram levados. Os equipamentos foram apreendidos com Daniel Soares, Renato
Drumond Tardin, Adrienison Barbosa Santos, que recolhiam dinheiro para os PMs,
e o cabo Marcelo Bento Vidile, um dos recebedores de propina. Eles foram presos
em abril do ano passado em blitz na Avenida do Contorno, em Niterói.
Como funcionava o esquema Arte: O Dia
“No local havia coisas de mais valor e eles só
roubaram o documento onde estavam os celulares. Mas já havíamos feito a
transcrição e o inquérito estava na fase final. Desconfiamos de facilitação por
parte de policiais. Tudo está sendo apurado”, anunciou Amin. Até à noite de
ontem, 66 militares e 22 traficantes haviam sido presos. Os PMs vão ficar
detidos em várias unidades, além do Batalhão Prisional, antigo BEP, em Niterói.
Gravações telefônicas
Em 3 de abril de 2016, às 17h44, escutas flagraram
conversas entre traficantes e PM sobre o sequestro de bandidos. Militares
pediam o resgate.
TRAFICANTE: Os cana quer (sic) cinco pra soltar nós.
HNI: Rodou com o que?
TRAFICANTE: Com pó de 30. Eles quer (sic) cinco mil pra soltar nós, e eles quer rápido, senão vai levar nós de dura.
POLICIAL (pega o telefone): Três caixas (R$ 3 mil). Manda o formiguinha trazer igual traz sempre. Você sabe que com a gente é pureza. Vai vim (sic), vai trazer três caixas e a gente vai liberar os moleques.
TRAFICANTE: Eu tô te dando o papo reto. Os moleque você tá ligado que é vapor. Não adianta, mano, que eu não tenho como dar dinheiro da firma sem falar com o dono da boca não, parceiro.
POLICIAL: Aqui um é vapor e o outro atividade. Por tudo que aconteceu da última vez: ficou faltando 1.500, ia vim 2 mil ( sic) e veio 500. Manda duas caixas que a gente libera.
HNI: Rodou com o que?
TRAFICANTE: Com pó de 30. Eles quer (sic) cinco mil pra soltar nós, e eles quer rápido, senão vai levar nós de dura.
POLICIAL (pega o telefone): Três caixas (R$ 3 mil). Manda o formiguinha trazer igual traz sempre. Você sabe que com a gente é pureza. Vai vim (sic), vai trazer três caixas e a gente vai liberar os moleques.
TRAFICANTE: Eu tô te dando o papo reto. Os moleque você tá ligado que é vapor. Não adianta, mano, que eu não tenho como dar dinheiro da firma sem falar com o dono da boca não, parceiro.
POLICIAL: Aqui um é vapor e o outro atividade. Por tudo que aconteceu da última vez: ficou faltando 1.500, ia vim 2 mil ( sic) e veio 500. Manda duas caixas que a gente libera.
Homicídios aumentaram
O município de São Gonçalo é considerado um dos mais
violentos do estado. Segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), de janeiro
a abril houve 125 homicídios dolosos e 1.951 roubos de carros. Em 2011, a juíza
Patrícia Acioli foi executada com 21 tiros. Onze PMs do 7º BPM (São Gonçalo),
entre eles o então comandante Cláudio Silva Oliveira, foram condenados.
Patrícia não aceitava os altos registros de mortes
em confrontos com militares do batalhão. Desde o assassinato de Patrícia, o
número de homicídios envolvendo militares subiu de 18, em 2011, para 76, em
2015. “Isso nos deixa triste porque desde a morte da minha irmã a gente percebe
que os policiais continuaram praticando atos ilegais”, disse Simone
Acioli.
Patrícia foi lembrada na decisão do juiz Alexandre
Abrahão, da 2ª Vara Criminal de São Gonçalo, que decretou as prisões dos 96
PMs. “A tropa do 7º BPM, não é de hoje, protagoniza tristes episódios
criminosos”, afirmou em trecho.
Como funcionava o esquema Arte: O Dia
"Esquema de Cabral era maior do que eu supunha", diz doleiro
Chebar prestou depoimento e afirmou que ex-governador via
movimentação em contas como um "negócio"
O doleiro Renato Chebar prestou depoimento nesta quarta-feira (28) ao juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, e afirmou que o esquema de corrupção montado pelo ex-governador Sérgio Cabral era muito maior do que ele imaginava. "O esquema era muito maior do que eu supunha. Eu era uma célula dentro do esquema. O esquema era dez vezes maior", disse Chebar.
O Ministério Público
Federal (MPF) aponta Chebar como o responsável por cuidar das finanças Cabral.
Ele afirmou que o volume de dinheiro nas contas do ex-governador aumentou no
período em que ele governou o Rio de Janeiro.
Chebar afirmou que
Cabral tratava os depósitos e transferências em suas contas como um
"negócio". "Era uma ação natural. Um negócio", disse,
prosseguindo: "Cuido das contas dele desde 2000. Na época, ele tinha
US$ 2 milhões numa conta nos Estados Unidos. Quando ele se tornou governador, o
volume de dinheiro que entrou na conta aumentou muito."
Chebar confirmou a
Bretas a delação que prestou ao Ministério Público Federal. Ele reafirmou que o
empresário Eike Batista pagou US$ 18 milhões em propina a Cabral.
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