Janot denuncia políticos do PMDB do Senado por organização criminosa
PGR aponta que atuais e ex-senadores receberam R$ 864,5 milhões
em propina paga por fornecedores da Petrobras. Denunciados negam
irregularidades.
O procurador-geral
da República, Rodrigo Janot, apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta
sexta-feira (8) denúncia contra políticos do PMDB do Senado.
Foram denunciados os
senadores Edison Lobão (MA), Jader Barbalho (PA), Renan Calheiros (AL), Romero
Jucá (RR) e Valdir Raupp (RO), além do ex-senador e ex-presidente José Sarney.
Também foi denunciado o ex-senador pelo PSDB e ex-presidente da Transpetro
Sérgio Machado.
De acordo com as
investigações, os sete políticos receberam R$ 864,5 milhões em propina paga
por fornecedores da Petrobras e sua subsidiária Transpetro (veja mais abaixo
nesta reportagem).
A acusação aponta crime
de organização criminosa, cuja pena varia entre 3 a 8 anos de prisão, além de
multa.
LEIA A ÍNTEGRA
DA DENÚNCIA
Para a PGR, há indícios
de que o grupo mantinha controle sobre as diretorias Internacional e de
Abastecimento da Petrobras, além da Transpetro, para angariar propinas de
fornecedores da estatal.
Além da pena de prisão,
Janot quer que os atuais senadores percam seus mandatos e que todos paguem R$
200 milhões, metade como devolução de desvios e outra metade como indenização
por danos morais. O restante do valor desviado poderá ser cobrado em outros processos,
segundo a PGR.
O que dizem os denunciados
Em nota, o senador
Romero Jucá afirmou que
"acredita na seriedade do STF ao analisar as denúncias apresentadas pelo
PGR" e que "espera, contudo, celeridade nas investigações."
Também em nota, o senador
Renan Calheiros informou que
"para criar uma cortina de fumaça tentando desviar o assunto e encobrir
seus malfeitos, o procurador-geral começa a disparar mais denúncias
defeituosas."
"Essa é mais uma
tentativa de vincular-me aos desvios criminosos da Petrobras, me denunciando
várias vezes pela mesma acusação. Ocorre que eu nunca mantive qualquer relação
com os operadores citados e o procurador já sabe disso", afirmou
Calheiros.
O senador Jader Barbalho disse que a
denúncia "é uma cortina de fumaça lançada por Janot, nos seus últimos dias
de PGR, para confundir a opinião pública, depois que ele beneficiou a J&F
com imunidade processual, inexistente na legislação."
Barbalho diz ainda que
"Janot já está na história como o procurador responsável pela Operação Tabajara
da PGR, na qual seu braço direito, Marcello Miller, era o agente duplo que
prestava assessoria aos maiores assaltantes dos cofres públicos: os irmãos
Batista."
O senador Valdir Raupp afirmou em nota que
"como nos demais casos em que foi, injustamente, acusado irá demonstrar
sua inocência perante esta nova situação por não ter indicado nenhum dirigente
para diretorias da Petrobras e da Transpetro."
"É de se estranhar
e causar espanto que a denúncia feita no apagar das luzes da atual gestão da
Procuradoria Geral da República, tenha como base delações feitas por pessoas
que não conheço e nunca tive qualquer relação pessoal ou política",
afirmou o senador.
O advogado Antonio
Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende Romero Jucá, Edison
Lobão e José Sarney, afirmou que recebe a denúncia "com
perplexidade". Para ele, Janot demonstra que é contra políticos e
partidos.
"Se fazem parte de
um partido político que deu apoio a um governo que Janot é frontalmente
contrário, essas pessoas poderão ser denunciadas sem nenhuma base legal.
Esperamos que o Supremo Tribunal Federal não receba essa denúncia",
afirmou.
Especificamente sobre
Sarney, Kakay disse ainda que o ex-presidente não fazia parte das discussões
sobre indicações técnicas para cargos. "José Sarney sequer deveria estar
nessa linha, porque não participou sequer dessas indicações", disse.
O PMDB também
divulgou nota em que afirma que a denúncia "é mais uma tentativa de
envolvimento do PMDB e carece de provas por parte do Ministério Público."
"Tais denúncias
são fundamentadas apenas em delações - como veio a público recentemente -
direcionadas e pouco confiáveis. O PMDB confia que o Supremo Tribunal Federal
arquivará tais denúncias."
A defesa do ex-senador
Sérgio Machado disse em nota que ele continua colaborando com a Justiça.
"Sua colaboração trouxe provas materiais sobre crimes envolvendo políticos
e fornecedores da Transpetro, que vêm sendo confirmados por outras
colaborações, e já resultou na instauração de diversos procedimentos perante o
Supremo Tribunal Federal, além de inquéritos policiais na Subseção Judiciária
de Curitiba", diz a nota.
R$ 864,5 milhões em propina
As investigações
apontaram que os sete políticos receberam R$ 864,5 milhões em propina, com
prejuízo de R$ 5,5 bilhões para a Petrobras e R$ 113 milhões para a Transpetro,
subsidiária da estatal na comercialização de gás.
A denúncia diz que o
grupo obteve cargos na Petrobras e na Transpetro em troca do apoio dado ao
governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010).
As vantagens indevidas
seriam cobradas por diretores indicados pelo partido, que se mantinham no cargo
graças ao apoio dos políticos.
"Os agentes
políticos, plenamente conscientes das práticas indevidas que ocorriam na
Petrobras, tanto patrocinavam a nomeação e manutenção dos diretores e dos
demais agentes públicos no cargo, quanto não interferiam nem fiscalizavam
devidamente o cartel e irregularidades subjacentes", diz a denúncia.
Outras denúncias
Na semana passada, uma denúncia
semelhante foi apresentada contra políticos do PT, incluindo os
ex-presidente Dilma Rousseff e Luiz
Inácio Lula da Silva, este apontado como líder da organização criminosa.
Os políticos do PP já
foram denunciados pelo mesmo crime e a PGR ainda prepara denúncia contra
membros do PMDB da Câmara, entre os quais o presidente Michel Temer.
"Em comum, os
integrantes do PT, do PMDB e do PP queriam arrecadar recursos ilícitos para
financiar seus projetos próprios. Assim, decidiram se juntar e dividir os
cargos públicos mais relevantes, de forma que todos pudessem de alguma maneira
ter asseguradas fontes de vantagens indevidas", diz a denúncia.
Com a denúncia em mãos,
o ministro Luiz Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, deverá notificar
os acusados a apresentarem uma defesa prévia.
Depois, levará o caso
para análise da Segunda Turma do STF, que decidirá se eles viram ou não réus
pelo crime. Compõem o colegiado, além de Fachin, os ministros Gilmar Mendes,
Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello.
'Pacto de sangue': As acusações de Palocci contra Lula e Odebrecht
Em depoimento ao juiz federal Sergio Moro, ex-ministro diz que líder
petista sabia do esquema de corrupção na Petrobras e que empreiteira
"dava propinas frequentes ao presidente Lula e ao PT".
A
relação entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a empreiteira
Odebrecht envolvia um "pacto de sangue" que consistia em presentes
pessoais ao líder petista, como o sítio de Atibaia (SP), a doação do prédio de
um museu dedicado a seu legado, palestras no valor de R$ 200 mil, uma reserva
de R$ 300 milhões de reais.
A afirmação, que já
apareceu em acusações de delatores e testemunhas da operação Lava Jato, pela
primeira vez partiu de um dos homens próximos a Lula: seu ex-ministro da
Fazenda, o petista Antonio Palocci.
Em depoimento ao juiz
federal Sergio Moro na tarde desta quarta-feira, em ação penal que investiga a
acusação de que a Odebrecht doou um terreno para a construção de prédio do
Instituto Lula como propina, Palocci afirmou que o ex-presidente tinha
conhecimento do esquema de corrupção na Petrobras e se preocupou no início, mas
depois pediu que os diretores da estatal fizessem reservas partidárias a partir
dos desvios.
Palocci está preso
desde setembro de 2016. Em junho passado, foi condenado por Moro a 12 anos de
prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. No depoimento, também acusa
de crimes a ex-presidente Dilma Rousseff, o pecuarista José Carlos Bumlai e o
ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, entre outros nomes.
Confira os pontos mais importantes do depoimento:
1. Sítio, palestras e museu: o pacto
de sangue com a Odebrecht
Durante o depoimento,
Palocci afirma que Emílio Odebrecht procurou Lula no fim de 2010, no fim de seu
governo, para fazer um "pacto de sangue".
"Eu chamei de
pacto de sangue porque envolvia um presente pessoal, que era um sítio, envolvia
um prédio de um museu pago pela empresa, envolvia palestras pagas a R$ 200 mil,
fora impostos, combinadas com a Odebrecht para o próximo ano, várias palestras,
envolvia uma reserva de 300 milhões de reais", diz.
Emilio é pai de Marcelo
Odebrecht, que era presidente da empreiteira e está preso desde junho de 2015 -
ele deve deixar o regime fechado no fim deste ano, como parte do acordo de delação
premiada fechado entre os advogados da empreiteira e o Ministério Público
Federal.
Segundo Palocci, Lula o
procurou após a conversa com Emílio e ordenou que não brigasse com a Odebrecht
- "ele mandou eu recolher os valores".
Ao detalhar a relação
entre Odebrecht e Lula, o ex-ministro afirma que a corrupção era longeva e
conhecida dos mais íntimos do ex-presidente. "A Odebrecht era uma
colaboradora", afirma.
Na sequência, no
entanto, ele corrige o uso do termo "colaboradora": "O senhor
(Moro) desculpa, às vezes eu... 30 anos treinando para falar dessa forma, que a
Odebrecht dava propinas frequentes ao presidente Lula e ao PT".
Palocci classifica a
ligação entre a empresa e os governos de Lula e Dilma como "intensa".
"Foi uma relação
bastante intensa, bastante movida a vantagens dirigidas à empresa, a propinas
pagas pela Odebrecht para agentes públicos em forma de doação de campanha, em
forma de benefícios pessoais, em forma de caixa 1, caixa 2", diz. "Eu
tenho conhecimento porque participei de boa parte desses entendimentos na
qualidade de ministro da Fazenda do presidente Lula e de ministro da Casa Civil
da presidente Dilma."
O ex-ministro diz que
conhecia os Odebrecht desde antes do primeiro governo petista. "Eu estive
com eles desde 1994 quando o presidente Lula os conheceu", conta.
"Então eu tratava de todo tipo de tema com eles (Odebrecht), inclusive de
temas ilícitos. Inclusive."
Segundo ele, o
"pacto de sangue" oferecido a Lula por Emílio Odebrecht surgiu de
"certo pânico" da companhia com a posse de Dilma - como ministra da
Casa Civil, ela teria liderado um embate com a empreiteira e impedido que
conquistasse as obras das duas usinas do Rio Madeira - no fim, ficou apenas com
uma, e "a um preço muito ruim".
"Ele procurou o
presidente Lula nos últimos dias do seu mandato e levou um pacote de propinas
(...) que envolvia esse terreno do instituto, que já estava comprado e o seu
Emílio apresentou (...), o sítio pra uso da família do presidente Lula - que
ele já estava fazendo a reforma, que já estava em fase final, e disse (...) que
já estava pronto - e também disse (...) que ele tinha à disposição dele para o
próximo período, para fazer as atividades políticas dele, R$ 300 milhões."
Palocci diz ter ficado
"chocado" com a oferta, que representava uma guinada no
relacionamento com a empreiteira - e conta como ficou sabendo dela.
"No dia seguinte,
de manhã, o presidente Lula me chamou no Palácio da Alvorada, e me conta da
reunião. Ele também se mostrou um pouco surpreso e disse: 'Olha, ele só fez
isso porque ele tem muito receio da Dilma. Porque ele nunca tratou de recursos
comigo e dessa vez ele tratou de um pacote de coisas e de recursos muito alto'.
E ele pediu pra tratar desse recurso com o Marcelo Odebrecht."
Segundo o ex-ministro,
Emílio não trouxe uma "pauta de desejos" específica em troca desse
pacto de sangue. "Apresentou vontade de que com o governo da presidente
Dilma a relação da Odebrecht com o governo continuasse fluida, como havia sido
com o governo Lula."
No Twitter, Cristiano
Zanin Martins, advogado de Lula, afirmou que "Palocci compareceu ato
pronto para emitir frases de efeito como 'pacto de sangue', esta última anotada
em papéis por ele usados na audiência". Para o advogado, "Palocci
repete papel de validar, sem provas, as acusações do MP (Ministério Público)
para obter redução de pena."
Em nota, por sua vez, a
Odebrecht afirmou que "está colaborando com a Justiça no Brasil e nos
países em que atua".
"Já reconheceu os
seus erros, pediu desculpas públicas, assinou um Acordo de Leniência com as
autoridades do Brasil, Estados Unidos, Suíça, República Dominicana, Equador e
Panamá, e está comprometida a combater e não tolerar a corrupção em quaisquer
de suas formas."
2. Conta corrente com o PT
De acordo com Palocci,
as vantagens indevidas pagas pelas empreiteiras ao PT não se destinavam a
retribuir benesses específicas obtidas em um ou outro contrato público.
Tratava-se de manter uma relação amigável e constante com os mandatários para
estar sempre em posição privilegiada em concorrências públicas.
Por isso, segundo o
ex-ministro, a Odebrecht e outras construtoras mantinham uma conta corrente
ativa com o PT, frequentemente abastecida com propina. "A vantagem
(repassada ao partido) dá vantagens para a empresa. Essa empresa cria uma conta
para destinar aos políticos que a apoiaram", explica.
Em contrapartida, de
acordo com o raciocínio de Palocci, Lula e o PT criariam ambiente propício na
Petrobras para que as empresas obtivessem gordos contratos:
"O presidente
mantém lá (na Petrobras) diretores que apoiam a empresa, para dar a ela
contratos. Esses contratos geram dinheiro. Algumas (empresas) criam operações
estruturadas, outras criam caixas dois, outras criam doleiros, e com esse
dinheiro pagam propina aos políticos. É isso. Isso aconteceu durante esse
período."
Palocci não especifica
o período, mas infere-se que ele está falando dos governos Lula e Dilma.
Os detalhes da
conta-corrente com a Odebrecht foram tratados em reuniões entre Emílio
Odebrecht e Lula. De acordo com Palocci, Emílio se comprometera a fazer um
repasse ao ex-presidente de R$ 300 milhões no final de 2010 e acenara com a
possibilidade de ser mais. Ao conversar com Marcelo Odebrecht, no entanto,
ouviu que houve uma "divergência de valores".
"Ele falou: 'não é
R$ 300 milhões, meu pai se enganou, R$ 300 milhões é a soma daquilo que foi
dado com aquilo que ainda tem disponível'", diz o ex-ministro.
Embora tenha se
envolvido na negociação sobre a conta corrente, Palocci afirma ter sido contra
essa ideia:
"Não queria ter
contas com a Odebrecht. Insisto, doutor, não por santidade, eu achava que não
devia ter conta corrente, eu achava que devia continuar tendo uma relação de
confiança, onde a gente buscava os recursos quando necessário. Eu tinha essa
postura."
Palocci, no entanto,
foi voto vencido diante do interesse do próprio Lula em viabilizar a conta
corrente:
"Não era prática
do Emílio tratar de reservas e recursos com o presidente Lula. Esse assunto não
era pauta das reuniões. Mas nessa foi. Esse foi o espanto do presidente Lula.
Não o espanto de ter disponível R$ 300 milhões, ele gostou disso. Tanto que na
segunda vez falou que o dr. Emílio tinha confirmado os 300 e que poderia ser
mais, pra eu cuidar disso. Não é pra cuidar do espanto dele, é pra cuidar do
dinheiro", disse.
Emílio Odebrecht fez
parte do mega acordo de delação premiada negociada em 2016 com o Ministério
Público Federal. Em seus depoimentos, confirmou o repasse de propinas para o
PT, a pedido do próprio Lula. Mas não citou a reunião dos R$ 300 milhões da
conta corrente. Marcelo Odebrecht, no entanto, mencionou o assunto em
depoimentos da colaboração firmada.
3. Dilma ajudou a manter esquema
De acordo com Palocci,
Dilma não apenas sabia do esquema corrupto entre PT, Odebrecht e outras
empreiteiras, como foi beneficiária e mantenedora dos arranjos. Segundo ele,
tanto as campanhas presidenciais de Lula quanto as de sua sucessora foram
custeadas com dinheiro ilícito.
"Várias vezes eu
falei para empresas: o senhor, pode fazer doações para a campanha do presidente
tal e da presidente tal?", relata, e continua:
"Eu sabia que
depois os tesoureiros iam lá e (as empresas) faziam pagamento lícitos e
ilícitos, caixa 1 e caixa 2. Muitas vezes era caixa 1 para simular pagamento
legal, mas a origem do dinheiro era ilegal."
Na sequência, Palocci
dá como exemplo da mecânica de doações ilegais à campanha de reeleição de
Dilma, em 2014.
"Essa foi a
campanha que mais teve caixa 1 e foi uma das que mais teve ilicitudes. Por quê?
Porque o crime se sofisticou no campo eleitoral, as pessoas viram que o
problema era o caixa 2, então transformaram tudo em caixa 1. O ponto é a origem
criminosa dos valores, a Lava Jato desvendou esse mistério", afirma
Palocci.
A ex-presidente Dilma e
o PT sempre negaram caixa 2 ou ilegalidades no financiamento da campanha. No
entanto, Palocci dá exemplos de situações em que tais temas foram tratados na
presença dela ou dependeram de sua chancela.
Segundo o ex-ministro,
em meados de 2010 ele participou de uma reunião com Lula, Dilma e o então
presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli. No encontro, realizado na
biblioteca do Palácio da Alvorada, o então presidente tratava da exploração do
pré-sal.
De acordo com Palocci,
Lula teria dito:
"Palocci está aqui
porque ele vai lhe acompanhar nesses projetos, para que eles tenham total
sucesso, e para que ele garanta que uma parcela desses projetos financie a
campanha dessa companheira aqui (Dilma), que eu quero ver eleita presidente do
Brasil."
Ainda naquele ano, mas
após a eleição de Dilma, teria havido uma nova reunião. Dessa vez, além de
ambos, estariam Lula e Emílio Odebrecht. O objetivo do encontro, afirma o
ex-ministro, era colocar Dilma a par das relações entre o PT e a empresa, para
que ela conservasse todos os acordos - "lícitos e ilícitos", nas
palavras dele.
Palocci diz que Dilma
cumpriu o papel a contento, "em diversas ocasiões".
"Na área de
aviação, por exemplo. Odebrecht desejava muito ter um aeroporto de porte sob
seu comando, na medida que o governo privatizou os aeroportos. Na primeira
leva, Guarulhos, Viracopos, Brasília, a Odebrecht perdeu os três. Ela queria
muito o de Campinas, mas perdeu. Entrou com o recurso contra o consórcio vencedor
Triunfo/UTC, entrou tentando derrubar na Anac (Agência Nacional de Aviação
Civil)", diz Palocci.
Como a presidência da
Anac àquela altura era uma nomeação de Palocci, a empresa teria pedido a ele
que intercedesse a seu favor, o que o ex-ministro nega ter feito. Ele, no
entanto, não tardou em arrumar uma solução administrativa que beneficiasse a
Odebrecht, em 2013, com a anuência de Dilma.
"Eu fui à
presidente Dilma e ela disse que eles deviam ficar calmos que em uma próxima
licitação ela cuidaria desse assunto. Retiraram o recurso que tinham na Anac e
foram beneficiados na licitação do Galeão. Como foram beneficiados? Houve uma
cláusula nessa licitação que impedia o vencedor da licitação de Cumbica de
participar da licitação do Galeão", diz.
Ele reforça: "(A
cláusula) foi colocada por solicitação da Odebrecht. E eu tive participação
nisso".
Dilma não se pronunciou
até a publicação deste texto.
4. Petrobras, corrupção e campanhas
Segundo o ex-ministro,
a maior parte das doações da Odebrecht para as campanhas petistas -
principalmente as presidenciais - era feita em caixa 1. "Mas o Caixa 1
muitas vezes originário de atitudes e contratos ilícitos."
Questionado por Moro
sobre "contratos que geraram crédito" - ou seja, aqueles nos quais a
empreiteira pagava um percentual em propina -, Palocci diz que foram
"diversos". Mas fez questão de citar uma estatal. "Os da
Petrobras, quase todos geraram crédito."
O esquema, diz,
funcionava da seguinte forma: após as diretorias serem nomeadas, foi
desenvolvida "uma relação de intenso financiamento partidário, de
políticos, pessoas, empresas".
"Na diretoria de
Serviços, o PT; na diretoria Internacional, o PMDB, e na diretoria de
Abastecimento, o PP", detalha. "Esse foi um ilícito crescente na
Petrobras, até porque as obras cresceram muito e com elas, os ilícitos."
O ex-ministro relata
ter conversado com Lula sobre "essas relações". E deu exemplos:
"Quando o
presidente foi reeleito, em 2007 ele me chamou no Palácio da Alvorada e me
falou: 'Soube que na área de serviços e de abastecimento tá havendo muita
corrupção'. Eu falei: 'É verdade'. Ele falou: 'E o que que é isso?'. Eu falei:
'É aquilo que foi destinado pra esses diretores: operar para o PT de um lado e
para o PP de outro'.
Palocci afirma que Lula
disse ter pensado em "tomar providência". "Mas logo após veio o
pré-sal, e o pré-sal pôs o governo em uma atitude frenética em relação à
Petrobras (...). E aí as coisas continuaram correndo do jeito que eram."
O petista diz que a
Odebrecht sempre doou para suas campanhas pessoais, e confessa que muitas vezes
de forma ilegal.
"Até antes de vir
aqui chequei no TSE pra ver se tinha alguma doação legal no meu nome e não
tinha. Se não tinha doação legal eu lhe garanto que teve doação ilegal, porque
a Odebrecht não deixaria de doar para uma campanha minha."
Ele conta ter feito
pedidos à empreiteira para as campanhas presidenciais.
"Normalmente não
foi no período em que eu era ministro, porque eu pedi antes de eu ser ministro,
em 2002, e em 2006 eu já não era mais ministro. Mas no período em que eu fui
ministro eu tive uma relação fluida com eles também. Não escondo isso
não", afirma.
"Eu dizia a eles:
'contribuam com a campanha do presidente Lula, ou da presidente Dilma. E eles
falavam 'estamos pensando em um valor de R$ 50 milhões', e eu falava 'pode
ser', e mais tarde voltava lá e falava 'quem sabe um valor de R$ 60
milhões'."
5. Terreno do Instituto Lula e
apartamento em São Bernardo do Campo
Palocci fala ainda
sobre as suspeitas de que, em troca de vantagens em contratos da Petrobras, a
Odebrecht teria comprado um terreno, que deveria sediar um museu do Instituto,
e uma cobertura em São Bernardo do Campo, ao lado do apartamento em que o
presidente vive com a família.
De acordo com o
ex-ministro, a negociação envolvendo o terreno aconteceu ainda em 2010, no
último ano do petista na Presidência, motivo pelo qual a área não poderia ser
doada a Lula legalmente. Havia uma urgência para conseguir um lugar onde ele
pudesse guardar o acervo presidencial.
Palocci diz ter sido
contrário ao modo como a situação foi conduzida.
"Na época eu não
estava entendendo a pressa. Eu sugeri ao Marcelo (Odebrecht): 'compre o
terreno, quando o instituto for instalado, você doa o prédio'. Não é ilegal
doar um prédio. Ou pelo menos fica com uma aparência mais legal. Desculpa,
doutor, eu não estava de santo, não. Eu só estava querendo... nosso ilícito com
a Odebrecht já estava muito grande naquele momento. Essa compra não precisava
ser um ilícito. Ou pelo menos (seria) um ilícito travestido de lícito",
diz.
Em seu depoimento na
condição de delator, Marcelo confirmou que a Odebrecht comprou o terreno.
A transferência do
Instituto Lula para o local jamais se concretizou porque, de acordo com o
ex-ministro, ele convenceu o ex-presidente de que a transação seria um risco
muito grande:
"Mas no conjunto,
considerando a pessoa do presidente Lula, o governo, a Odebrecht, o Instituto
Lula, aquilo era um ilícito grave, uma fratura exposta. Era um convite à
investigação", diz Palocci.
Um dos artífices ideia
do terreno, que ele qualificada de "trapalhada", foi José Carlos
Bumlai.
Segundo o ex-ministro,
também coube ao pecuarista a negociação para a compra da cobertura vizinha à de
Lula, em São Bernardo. O imóvel seria importante para acomodar os seguranças e
pertences do petista. No esquema narrado por Palocci, um primo de Bumlai ficou
responsável por comprar o imóvel contando com algum tipo de compensação do
Instituto Lula.
Para Palocci, Lula
"agia com pouco cuidado em relação a isso".
"Perguntei:
'presidente, do que se trata esse apartamento? Eu nunca ouvi falar dele'. E ele
me explicou que era um apartamento que a segurança do presidente tinha alugado
e que ele gostou daquele apartamento, que para ele que tinha cinco filhos
ficava melhor e ele estava pensando em comprar esse apartamento. Foi essa a
informação que ele me deu apenas. Eu falei com ele sobre a conversa com o
Bumlai do Instituto e disse que não queria fazer desse jeito."
A BBC Brasil não
conseguiu contato com a defesa de Bumlai. Em depoimento à Justiça, ele falou
anteriormente que tratou da instalação do Instituto Lula em 2010 diretamente
com Marcelo Odebrecht.
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