Tribunal nada fez sobre processos 

que apontaram irregularidades nas 

obras do Maracanã

Reparo. O Maracanã em obras para a Copa de 2014: dois dos 22 processos instaurados no TCE pedem, com base em auditorias, o estorno de R$ 93 milhões pagos indevidamente ao consórcio responsável pela reforma do estádio

O TCE engavetou por quase 6 anos 21 processos sobre a reforma do Maracanã, apesar de constatados repasses indevidos de R$ 93 milhões às empreiteiras, contam JULIANA CASTRO e CHICO OTAVIO. Com a obra na mira da Lava-Jato, os processos deverão ser retomados. Enquanto o Ministério Público Federal (MPF) inicia no Rio investigações sobre suspeitas de corrupção na reforma do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014, motivadas por delações da Operação Lava-Jato, o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) mantém parados 21 dos 22 processos relativos à obra no estádio, do período entre 2010 e 2014. Só agora, quase seis anos depois que os primeiros processos foram instaurados, o TCE procura desengavetá-los.
Os processos levantam dúvidas, cobram esclarecimentos e apontam irregularidades nas obras. Dois deles pedem, com base em auditorias, o estorno de repasses indevidos ao consórcio responsável, formado pela Odebrecht e pela Andrade Gutierrez, no valor total de R$ 93 milhões. Porém, como o contrato da obra já foi encerrado com o pagamento integral às empresas, a medida pode ter perdido a eficácia.
DELATORES DENUNCIARAM PROPINA A reforma do Complexo do Maracanã para a Copa das Confederações e para a Copa do Mundo de 2014 deveria ter custado ao governo fluminense R$ 705 milhões, mas o acolhimento de 16 termos aditivos, após a assinatura do contrato, elevou o valor para R$ 1,2 bilhão. Em delação premiada ao MPF, dois exdirigentes da Andrade Gutierrez, Rogério Nora Sá e Clóvis Peixoto Numa, denunciaram que o então governador Sergio Cabral (PMDB) cobrou o pagamento de 5% do valor total do contrato para permitir que a empresa se associasse à Odebrecht e à Delta — que saiu antes da conclusão da obra — no “Consórcio Maracanã Rio 2014”, que disputaria a concorrência em 2010.
Dos 22 processos abertos pelo TCE para auditar a obra, apenas um chegou ao fim: o que aprovou o edital de licitação em junho de 2010. Os demais — um sobre o contrato, 16 sobre os aditivos e quatro sobre auditorias na obra, instaurados entre setembro de 2010 e maio de 2014 — ficaram travados na burocracia interna do tribunal. Entre outras conclusões, os auditores constataram a medição e a atestação de serviços com sobrepreço, como o reforço estrutural das novas rampas de acesso ao estádio e a instalação da estrutura metálica das arquibancadas.
Preocupados com o interesse dos investigadores na obra, que deverá ser alvo de uma força-tarefa criada recentemente no Rio, os conselheiros do TCE decidiram fazer os processos andarem. A primeira providência, publicada no Diário Oficial da última quinta-feira, foi unificar a relatoria nas mãos do conselheiro José Graciosa, uma vez que os 21 casos estavam distribuídos para relatores diversos e pelo menos oito deles estavam sem relator — um relator que se aposentou e outro que morreu, por exemplo, não foram substituídos.
Graciosa, porém, só poderá levar o voto ao plenário em 15 dias, prazo legal para a convocação de uma pauta especial. Isso porque a Odebrecht e a Andrade Gutierrez entraram com embargos de declaração — instrumento jurídico pelo qual uma das partes de um processo judicial pede ao tribunal que esclareça determinado aspecto de uma decisão proferida quando há alguma dúvida, omissão, contradição ou obscuridade. Neste caso, a lei exige uma pauta especial convocada em 15 dias. Os embargos de declaração foram interpostos em uma das auditoria; isso há mais de dois anos.
Embora o trecho divulgado sobre a delação premiada dos ex-dirigentes da Andrade Gutierrez se refira apenas ao governador, o papel do TCE na fiscalização da obra deverá entrar no horizonte da força-tarefa do MPF, cujo objetivo é apurar os desdobramentos da Lava-Jato no Rio. Em Brasília, já existe uma investigação em andamento, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sobre as obras das gestões do governador Luiz Fernando Pezão e o antecessor, Sergio Cabral, financiadas com dinheiro do governo federal. A Polícia Federal chegou a pedir o arquivamento, alegando não ter conseguido colher provas suficientes, mas o ministro-relator, Luís Felipe Salomão, preferiu oferecer vista à Procuradoria Geral da República antes de decidir.
TCE ALEGA ALTA COMPLEXIDADE Em média, o TCE leva cinco meses para decidir um processo. Questionada sobre a demora na conclusão dos processos relativos à reforma do Maracanã, a assessoria de comunicação do tribunal afirmou que a análise de casos relacionados a serviços de alta complexidade técnica e grande repercussão financeira demanda “longas e minuciosas verificações”. Disse que, devido à complexidade da matéria e do número de agentes envolvidos, recebeu uma série de documentos em resposta às diversas notificações. De acordo com a assessoria, a análise após o pagamento da obra não é ineficaz, pois o tribunal pode aplicar pena de imputação de débito, ou seja, determinar que os responsáveis devolvam os valores recebidos indevidamente.
Procuradas, as construtoras Odebrecht e Andrade Gutierrez informaram que não comentariam o caso. Por meio de sua assessoria, o ex-governador Sergio Cabral disse que “a licitação e o acompanhamento das obras de reforma do Maracanã para o atendimento das exigências da Fifa para a realização de jogos da Copa das Confederações 2013 e da Copa do Mundo 2014 foram realizados pela Secretaria de Obras do Governo do estado, órgão técnico que dispunha de autonomia para a gestão dos seus projetos”. Por isso, Cabral alega que não tem como comentar ou responder as perguntas relacionadas à execução da obra. Sobre o fato de ter sido citado nas delações premiadas, o peemedebista disse reiterar o posicionamento anterior de repúdio total às inverdades nelas contidas.
SECRETARIA DEFENDE ADITIVOS O GLOBO também questionou o governo do estado sobre o fato de a obra ter recebido 16 aditivos — um a cada três meses — e se não houve falha no projeto. A Secretaria estadual de Obras disse que as contas do Maracanã foram aprovadas por unanimidade pelo TCU.
“Em relação à execução, a complexidade da obras, sob todos os aspectos, exigiu inúmeros ajustes técnicos sejam nos projetos ou na metodologia executiva. O principal deles foi a substituição da antiga cobertura, condenada por estudos técnicos de especialistas. Outros fatores não previstos inicialmente também foram superados, como, por exemplo, o expressivo aumento de quantitativo de recuperação e reforço estrutural e de demolição verificados no decorrer das obras. À medida que prosseguia a execução da reforma, constatou-se que as áreas que necessitavam de recuperação e reforço estrutural eram muito mais extensas e em maior quantidade do que aquelas indicadas nos estudos iniciais de patologia”, informou a secretaria.
De acordo com o órgão, o valor integral da obra foi pago ao consórcio, mesmo com as indicações das auditorias para reter valores diante de irregularidades, porque todos os procedimentos administrativos, técnicos e financeiros seguiram a lei. Sobre a demora para o julgamentos dos processos no TCE, a secretaria afirmou que não lhe cabe valorar o tempo de análise dos Tribunais de Contas.

Empresa contratada sem licitação é alvo de processo

MPRJ exige que a Hope devolva cerca de R$ 1 milhão aos cofres públicos

WILSON AQUINO
Rio - Uma das empresas contratadas sem licitação pela Secretaria Estadual de Saúde (SES) para fornecer pessoal para “apoio administrativo e atividades auxiliares”, está sendo processada por improbidade administrativa. Na ação, o Ministério Público pede a Hope Recursos Humanos, ressarcimento de cerca de R$1 milhão aos cofres públicos. A empresa também é alvo da Operação Lava Jato, da Polícia Federal.
Conforme o ‘Informe do DIA’ noticiou na quarta-feira, a Hope ganhou contrato de R$3,579 milhões para prestar o serviço por 180 dias. A SES justificou a falta de licitação, alegando emergência. Porém, não explicou os motivos da urgência e nem quais funções os contratados vão exercer.
O processo no qual a Hope figura como ré é sobre um contrato firmado com a Prefeitura de Maricá, em 2009. A empresa deveria fornecer mão de obra para a Secretaria de Educação do município, mas, segundo investigação do MP, cobrava por prestadores de serviço que nunca trabalharam na prefeitura de Maricá. De acordo com a denúncia, a Hope recebeu pela prestação de serviços de 147 manipuladores de alimento, sendo que apenas 127 trabalhavam. A empresa também é acusada de cobrar e receber por outros serviços que nunca foram realizados.
Além da Hope, a SES também contratou, sem licitação, a Personal Service Recursos Humanos, por R$17 milhões. Desde 2014, as duas empresas investigadas fecharam negócios com o Governo do Rio no valor de R$193 milhões. Outra empresa beneficiada pela SES foi a Átrio Rio Service Tecnologia e Serviços, que ganhou contrato de R$ 7 milhões para executar os mesmo serviços. Procurada, a SES não quis se pronunciar. O DIA não conseguiu contato com as empresas citadas.

João Vaccari decide quebrar o silêncio
O homem que arrecadou e distribuiu mais de 1 bilhão de reais em propina para o PT, do qual foi tesoureiro, se prepara para falar à Lava Jato
Por: Robson Bonin10/06/2016 às 21:43 - Atualizado em 10/06/2016 às 21:43
 Bonin - Atualizado em 

“Se eu falar, entrego a alma do PT. E tem mais: o pessoal da CUT me mata assim que eu botar a cara na rua.”, João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT

" E tem mais: Se eu falar o pessoal da CUT  me mata assim que eu puser a cara na rua"          ( João Vaccari Neto, ex tesoureiro do PT ).


Em março passado, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto teve uma conversa reveladora com um de seus companheiros de cárcere. A situação de abandono do superburocrata petista, sentenciado a mais de 24 anos de prisão e com pelo menos outras quatro condenações a caminho, fez o interlocutor perguntar se ele não considerava a hipótese de tentar um acordo de delação com a Justiça. Conhecido pelo temperamento fechado, que lhe rendeu o apelido de "Padre" nos tempos de militância sindical, Vaccari respondeu como se já tivesse pensado muito sobre o assunto: "Não posso delatar porque sou um fundador do partido. Se eu falar, entrego a alma do PT. E tem mais: o pessoal da CUT me mata assim que eu botar a cara na rua". Algo aconteceu nos últimos dois meses. Depois desse diálogo travado com um petista importante e testemunhado por outros presos, Vaccari não resistiu às próprias convicções e resolveu romper o pacto de silêncio. O caixa do PT, o homem que durante décadas atuou nas sombras, o dono de segredos devastadores, decidiu delatar.
Preso desde abril do ano passado, o ex-tesoureiro, hoje no Complexo Médico-Penal de Pinhais, no Paraná, está corroído física e psicologicamente, segundo relatam pessoas próximas. Ele sabe que a hipótese de escapar impune não existe. Assim como os demais delatores, sabe que, aos 57 anos de idade, a colaboração com a Justiça é o único caminho que pode livrá-lo de morrer na prisão. Os movimentos do ex-tesoureiro em direção à delação estão avançados. Emissários da família de Vaccari já sondaram advogados especializados no assunto. Em conversas reservadas, discutiu-se até o teor do que poderia ser revelado. Um dos primeiros tópicos a ser oferecido aos procuradores trata da campanha eleitoral de Dilma Rousseff em 2014. Vaccari tem documentos e provas que podem sacramentar de vez o destino da presidente afastada, mas não só. O ex-tesoureiro sempre foi ligado ao ex-­presidente Lula e, como ele mesmo disse, conhece a alma do PT.
A cúpula do partido foi informada sobre a disposição do ex-tesoureiro há duas semanas. A primeira reação dos petistas foi de surpresa, depois substituída por preocupação. Até onde o ex-tesou­reiro chegaria? Uma comitiva foi despachada a Curitiba para tentar descobrir. Encarregado da missão estava o líder do PT na Câmara, Afonso Florence, que foi ao presídio acompanhado pelo ex-deputado paranaense Ângelo Vanhoni. Em Pinhais, ainda não se sabe exatamente de que maneira a comitiva conseguiu driblar os controles da prisão e conversar longamente com o ex-tesoureiro. Magoado, reclamando de ter sido esquecido na prisão, Vaccari confirmou sua decisão de quebrar o silêncio. Os petistas retornaram a Brasília estranhamente mais calmos. Florence procurou o líder do PT no Senado, Paulo Rocha, e relatou a conversa que tivera com Vaccari. "Será uma explosão controlada", disse. O que significava isso? O parlamentar explicou que Vaccari pode prestar depoimentos calculados, detonando explosões com efeito controlado para provar a "ilegitimidade" do governo Temer. Se o plano petista der certo, a carreira política de Dilma Rousseff será liquidada, mas também terá arrastado ao cadafalso o presidente interino Michel Temer, por comprometer a chapa eleita em 2014.

As provas de Odebrecht e o caixa 2 de Dilma

Executivos da empreiteira prometem entregar provas que confirmam remessas para abastecer o caixa dois de Dilma, conforme revelou ISTOÉ em sua última edição


Na última semana, ISTOÉ revelou que a presidente afastada, Dilma Rousseff, exigiu de Marcelo Odebrecht, em encontro pessoal depois do primeiro turno das eleições de 2014, R$ 12 milhões para a campanha à reeleição. O recurso abasteceu o caixa paralelo. Do total, R$ 6 milhões foram repassados ao marqueteiro João Santana e R$ 6 milhões ao PMDB. A afirmação foi feita por Odebrecht durante acordo de delação premiada, ainda em negociação. Executivos da empreiteira prometem fornecer provas para sustentar o que dizem. Segundo apurou ISTOÉ, a Odebrecht se comprometeu com o Ministério Público Federal a entregar uma série de documentos que confirmam a remessa de dinheiro para o caixa dois de Dilma. Entre esses papéis estão planilhas que detalham as datas e valores dos pagamentos, os nomes dos beneficiários e as contas no exterior onde foram feitos depósitos.
Serão identificadas contas e operadores, segundo um dos membros da força tarefa que participa das negociações, ainda não conhecidos pela Lava Jato. Algumas dessas contas já foram reveladas e os procuradores buscam detalhá-las com o apoio dos órgãos de controles de outros países, que possuem acordo com o Brasil. Ao longo da semana, mais uma revelação corroborou a prática criminosa. Preso pela Operação Lava Jato por pagar propina em contratos da Petrobras, o lobista Zwi Skornicki afirmou que os US$ 4,5 milhões que pagou João Santana eram, na verdade, para financiar a campanha da petista por meio de caixa dois.
Na chamada delação definitiva, os diretores da Odebrecht prometem munir os procuradores da força-tarefa da Lava Jato de mais informações estratégicas. Como o pagamento feito diretamente aos fornecedores da campanha, mas cujos recibos foram emitidos em nome do partido. Ou seja, o PT, segundo um dos procuradores, apresentou à Justiça Eleitoral despesas abatidas do caixa oficial da campanha, mas na verdade não usou os recursos declarados para efetuar esses pagamentos. A Odebrecht colocará à disposição da Lava Jato os registros internos com os valores e datas desses pagamentos, além de identificar as pessoas físicas e jurídicas que receberam os recursos.
MAIS UM Lobista Zwi Skornicki afirmou que os US$ 4,5 milhões que pagaram João Santana eram caixa dois de Dilma
MAIS UM Lobista Zwi Skornicki afirmou que os US$ 4,5 milhões que pagaram João Santana eram caixa dois de Dilma (Crédito:Giuliano Gomes)
A empreiteira entregará ainda todos os contratos de obras feitas no exterior e com financiamento do BNDES. São casos que fogem do 


alcance dos organismos de controle do País e que foram negociados pessoalmente pelo ex-presidente Lula. Também nesses casos foram feitos diversos pagamentos em contas abertas no exterior, algumas já reveladas. Até a semana passada, os membros da força tarefa planejavam abrir uma nova investigação específica para os financiamentos internacionais do BNDES, pois são casos que não guardam relação direta com o Petrolão.
A revelação trazida por ISTOÉ na última semana sacudiu o mundo político e ganhou as páginas de jornais internacionais. Na edição de terça-feira 7, o jornal o The New York Times traçou um perfil da presidente afastada em que faz menção à reportagem. O texto descreve que Dilma vive um estado de espírito inconstante, entre a sustentação da retórica de ter sofrido um golpe e a esperança de retornar ao poder. A publicação, no entanto, é enfática ao analisar que, em simultâneo às denúncias contra integrantes do novo governo, surgem revelações que a colocam cada vez mais no epicentro das investigações do Petrolão, como a revelação feita por ISTOÉ.
“Declarações (de Odebrecht) contribuem para desmoronar a imagem De Dilma” - Aloysio Nunes, líder do governo no Senado
“Declarações (de Odebrecht) contribuem para desmoronar a imagem De Dilma” – Aloysio Nunes, líder do governo no Senado
No cenário político, a declaração de Marcelo Odebrecht insuflou a oposição a Dilma. O líder do governo no Senado, Aloysio Nunes (PSDB-SP), disse que o conteúdo compromete a presidente afastada. Ele estuda pedir para incluir a acusação de Odebrecht no processo no Senado. “Essas declarações formam a convicção de que ela não pode continuar na Presidência. Contribuem para desmoronar a imagem virginal que o PT tentou construir”.

CORRUPTA E MENTIROSA

O acerto de R$ 12 milhões

Em acordo de delação, Marcelo Odebrecht revela que a presidente Dilma cobrou pessoalmente doação de campanha para pagar via caixa dois o marqueteiro João Santana e o PMDB em 2014

O diálogo que compromete Dilma

Entre o primeiro e o segundo turno da eleição de 2014, o tesoureiro da campanha de Dilma, Edinho Silva, cobrou de Marcelo Odebrecht uma doação “por fora” no valor de R$ 12 milhões para serem repassados ao marqueteiro João Santana e ao PMDB.  Marcelo se recusou a fazer o repasse, mas diante da insistência de Edinho disse que iria procurar Dilma.  Dias depois, em encontro pessoal, o empreiteiro e a presidente afastada mantiveram a conversa abaixo:
– Presidente, resolvi procurar a sra. para saber o seguinte: é mesmo para efetuar o pagamento exigido pelo Edinho?, perguntou Odebrecht.
– É para pagar, respondeu Dilma.
No acordo de delação premiada, firmado na última semana, o empreiteiro Marcelo Odebrecht fez uma revelação que, pela primeira vez, implica pessoalmente a presidente afastada Dilma Rousseff numa operação de caixa dois na eleição de 2014 – o que configura crime.  Aos procuradores da Lava Jato, o empresário afirmou que a mandatária exigiu R$ 12 milhões para a campanha durante encontro privado entre os dois. A conversa ocorreu depois do primeiro turno da disputa presidencial. O recurso, segundo Odebrecht, abasteceu o caixa paralelo de Dilma e serviu para pagar o marqueteiro João Santana e o PMDB. A história narrada pelo empreiteiro é devastadora para as pretensões de Dilma de regressar ao poder. Nela, Marcelo Odebrecht atesta que a presidente afastada não apenas sabia como atuou pessoalmente numa operação criminosa. Aos integrantes da força-tarefa da Lava Jato, o empreiteiro desfiou com riqueza de detalhes a ação da presidente. O empresário contou que durante o período eleitoral foi procurado pelo então tesoureiro da campanha, Edinho Silva.

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Alan Marques/Folhapress

O ex-ministro da Secretaria de Comunicação parecia apreensivo e reproduzia o mesmo comportamento persuasivo identificado por outros delatores do esquema do Petrolão, quando abordados pelo tesoureiro. A tensão derivava da urgência em amealhar mais recursos para reforçar o caixa da presidente. Na conversa, em tom impositivo, Edinho cobrou do empresário uma doação por fora que extrapolava o valor já combinado com os petistas anteriormente: um adicional de R$ 12 milhões. Deste total, deixou claro Edinho, R$ 6 milhões seriam para bancar despesas com marqueteiro João Santana e R$ 6 milhões para serem repassados ao PMDB. Oficialmente, o Grupo Odebrecht já havia doado R$ 14 milhões à campanha. Como a quantia extra era alta e, com o acréscimo, o valor doado representaria quase o dobro do acerto inicial, Marcelo ficou intrigado com a abordagem do tesoureiro.
Num primeiro momento, o empreiteiro reagiu de maneira negativa. Disse que se recusaria a fazer o pagamento. Diante da insistência de Edinho, disse-lhe, então, que procuraria pessoalmente a presidente Dilma. Foi o que aconteceu na sequência. Embora estivesse em plena efervescência da campanha eleitoral, Dilma abriu um espaço em sua agenda para receber o empresário. No encontro, segundo relato aos procuradores, Marcelo Odebrecht foi direto ao ponto. Questionou se era mesmo para efetuar o repasse exigido por Edinho. Ao que Dilma respondeu, sem titubear: “É para pagar”.
Ao narrar o diálogo aos integrantes da Lava Jato, Odebrecht compromete a presidente afastada naquilo que ela alardeava como uma vantagem em relação aos demais políticos mencionados no Petrolão: a pretensa ausência de envolvimento pessoal num malfeito. No momento em que a mandatária lutava para ganhar algum fôlego a fim de tentar reverter o placar do impeachment no Senado, a delação de Odebrecht confirmando que ela exigiu R$ 12 milhões do empreiteiro – numa ação nada republicana destinada a abastecer o caixa dois de sua campanha –  cai com uma bomba em seu colo. Pela letra fria da lei, utilizar-se de dinheiro não declarado na campanha eleitoral é fator decisivo para a perda do mandato presidencial. E Dilma não só se beneficiou do esquema do Petrolão como operou diretamente para que um recurso de caixa dois, portanto ilegal, irrigasse os cofres de sua campanha, conforme revelou Marcelo Odebrecht à Lava Jato. Embora não seja este o objeto do processo do impeachment em tramitação no Senado, o depoimento do empresário torna insustentável a situação de Dilma e praticamente inviabiliza o seu retorno à Presidência. Na Lava Jato, a delação de Odebrecht é tida como absolutamente verídica. Os procuradores e delegados têm certeza de que não se trata de apenas uma versão.

ISTOÉ ANTECIPOU Em edição de 20 de abril, reportagem revelou que Giles Azevedo orientou a agência Pepper no esquema de lavagem de dinheiro
ISTOÉ ANTECIPOU Em edição de 20 de abril, reportagem revelou que Giles Azevedo orientou a agência Pepper no esquema de lavagem de dinheiro

Tanto a Polícia Federal quanto a Procuradoria da República já reuniam evidências de que a Odebrecht havia alimentado as contas do marqueteiro João Santana por meio de caixa dois eleitoral. Em relato aos procuradores federais de Brasília na tentativa de sacramentar um acordo de delação premiada, Mônica Moura, mulher de Santana, havia reconhecido que, na disputa de 2014, pelo menos R$ 10 milhões teriam sido pagos a ela e ao marqueteiro fora da contabilidade oficial. Segundo Monica, só a Odebrecht pagou via caixa dois ao menos R$ 4 milhões. Em dinheiro vivo. Pelo acordo firmado com a Lava Jato, ela tinha ficado de relatar de que maneira e por quem foram repassados os outros R$ 6 milhões. Os valores teriam sido entregues diretamente para ela e usados para pagar fornecedores na área de comunicação. Os investigadores e agentes da PF já tinham identificado um depósito para o casal feito pela Odebrecht numa conta na Suíça, não declarada à Receita brasileira, de US$ 3 milhões.
Agora é possível entender a razão do embaraço da presidente afastada ao discorrer sobre o tema em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, publicada no último final de semana. Instada a se manifestar sobre a possibilidade de o empreiteiro a acusar de pedir dinheiro para pagar o marketing da campanha de 2014, a presidente afastada lançou mão de um discurso que, à luz dos fatos novos expostos por Marcelo Odebrecht no acordo de delação, não pára mais em pé: “Eu jamais tive conversa com o Marcelo Odebrecht sobre isso”. “Eu paguei R$ 70 milhões para o João Santana (em 2014). Tudo declarado para o TSE. Onde é que está o caixa dois?”, perguntou ela. Na referida entrevista, Dilma já havia se encalacrado ao negar que tivesse mantido encontros com o empreiteiro no Alvorada e “não se lembrar” de reuniões com o mesmo interlocutor no Palácio do Planalto. De acordo com os arquivos eletrônicos do Planalto, Dilma recebeu Odebrecht quatro vezes desde a sua posse. Duas no Palácio da Alvorada (em 26 de março e 25 de julho de 2014, ano eleitoral) e duas no Planalto (10 de janeiro e 10 de outubro de 2013).

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AFP PHOTO/STR/AFP/STR; José Cruz/Agência Brasil; Moreira Mariz


Unindo as peças do quebra-cabeças disponíveis até agora também é possível entender com mais clareza o motivo pelo qual a presidente Dilma se esforçou pela soltura de Marcelo Odebrecht da prisão: ela temia que viesse a público exatamente o que o empresário revelou aos procuradores da Lava Jato – e que, agora, ISTOÉ divulga com exclusividade.  Em sua delação, Delcídio do Amaral (sem partido- MS) expôs a gigantesca preocupação da presidente com o tema. Disse que Dilma nomeou o ministro Marcelo Navarro ao STJ em troca do seu compromisso de produzir um relatório em favor da liberdade do empreiteiro. Delcídio personifica a chamada prova testemunhal. Segundo ele, a nomeação de Navarro destinada ao propósito de soltar Odebrecht foi tratada por Dilma em conversas com ele próprio, durante caminhadas nos jardins do Alvorada. Como se sabe, Navarro realmente emitiu parecer pela concessão de um habeas corpus a Odebrecht, mas acabou sendo voto vencido no tribunal. Com base no depoimento de Delcídio o procurador-geral da Repúbica, Rodrigo Janot, requisitou ao STF a abertura de um inquérito para apurar se Dilma obstruiu a Justiça, o que também é considerado crime. Quando o então líder do governo assinou o acordo de delação, João Santana e sua mulher ainda desfrutavam a liberdade com o dinheiro das petrotraficâncias.
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Antes mesmo da prisão dos dois, a PF havia recolhido no celular de Marcelo Odebrecht uma mensagem endereçada a um executivo de sua empreiteira crivada de suspeitas: “Dizer do risco cta [conta] suíça chegar na campanha dela.” O cheiro de pólvora resultava do óbvio “risco” insinuado no texto de Odebrecht de que a conta na Suíça fosse descoberta e ficasse estabelecida a conexão com a campanha de Dilma em 2014. Com a delação de Marcelo Odebrecht, surge a peça que restava para compor um cenário letal para a presidente afastada na luta contra o impeachment. A Polícia Federal também já havia anexado ao inquérito da Operação Acarajé documentos apreendidos com a secretária da Odebrecht Maria Lúcia Tavares, presa em março. Uma das planilhas encontradas tinha o título “Feira-evento 14”. O documento detalhava sete pagamentos feitos entre 24 de outubro e 7 de novembro de 2014, totalizando R$ 4 milhões. Os investigadores descobriram que “Feira” era o apelido usado por funcionários da Odebrecht e pelo próprio ex-presidente da empresa para identificar a mulher do marqueteiro, responsável por cuidar das negociações financeiras do casal e da agência de publicidade Pólis, que comandou as campanhas da presidente Dilma Rousseff, em 2010 e 2014, e a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006.
Há duas semanas, em meio à divulgação das conversas gravadas pelo ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, soube-se que o meio político, em especial os caciques do PMDB, já precificava o potencial devastador da delação de Odebrecht sobre Dilma Rousseff. Num diálogo com Machado, ex-presidente da Transpetro, o presidente do Senado, Renan Calheiros, diz que a situação de Dilma Rousseff se tornaria insustentável a partir da delação da Odebrecht, porque iria “mostrar as contas” dela. “Mas, Renan, com as informações que você tem, que a Odebrecht vai tacar tiro no peito dela, não tem mais jeito”, disse-lhe o ex-presidente da Transpetro. “Tem não, porque vai mostrar as contas. E a mulher é corrupta”, sapecou Renan. Ao que Machado, na réplica, sentencia o desenlace irremediável da presidente. “Acabou, não tem mais jeito. Então a melhor solução para ela, não sei quem podia dizer, é renunciar ou pedir licença. O ex-senador José Sarney, em outro diálogo, repete o enredo entoado pelo antigo colega de Senado. Diz que a delação da Odebrecht “é uma metralhadora de [calibre] ponto 100”e relaciona a empreiteira a uma ação que a presidente afastada Dilma Rousseff teria feito diretamente durante campanha eleitoral. “Nesse caso, ao que eu sei, o único em que ela [Dilma] está envolvida diretamente é que falou com o pessoal da Odebrecht para dar para campanha do… E responsabilizar aquele [inaudível]”.
Preso desde junho de 2015 nas dependências da PF em Curitiba, Marcelo Odebrecht ainda deverá envolver no que vem sendo chamado de “delações das delações” ou “delação definitiva” ao menos 38 políticos. Um capítulo, em especial, é relativo ao ex-presidente Lula. O empreiteiro promete detalhar como se deram as obras do sítio em Atibaia (SP), cuja propriedade é atribuída ao petista. Outro personagem que também pode vir à baila é Giles Azevedo, braço-direito da presidente afastada, elo de Dilma com a agência Pepper. O empresário ainda pretende contar sobre financiamentos de campanhas eleitorais feitas no Brasil e no exterior – não só a de Dilma Rousseff. Na prática, a delação propriamente dita ainda não foi assinada. Após intensas negociações, a Odebrecht subscreveu um acordo de confidencialidade com a Lava Jato. O termo representa o início formal da negociação de delação. O termo é uma garantia para que o empresário comece a desnudar fatos ocorridos no esquema do Petrolão. Só depois da verificação do teor dos depoimentos pela força-tarefa da Lava Jato é que a Justiça avalizará o acordo. Há a expectativa de que próprio Emílio Odebrecht, pai de Marcelo, preste depoimentos. No atual estágio, e pela disposição dos envolvidos, é muito difícil que haja um recuo. O próprio juiz Sérgio Moro, num inequívoco gesto de boa vontade, extinguiu na última semana um dos processos contra a empreiteira (leia box na próxima página). Ou seja, está mais do que escancarado o caminho para a oficialização da delação de Odebrecht. Péssima notícia para os políticos. Ótima para o País.

PRESSÃO Ricardo Pessoa, da UTC, também relatou que foi compelido por Edinho Silva a doar mais dinheiro para a campanha de Dilma
PRESSÃO Ricardo Pessoa, da UTC, também relatou que foi compelido por Edinho Silva a doar mais dinheiro para a campanha de Dilma (Crédito:Wilson Dias/Agencia Brasil)

A tática recorrente de Edinho

O delator Ricardo Pessoa, da UTC, relatou aos investigadores que o tesoureiro da campanha de Dilma Rousseff em 2014, Edinho Silva, o pressionou a doar mais dinheiro. “O Edinho me disse: ‘Você tem obras na Petrobrás e tem aditivos. Não pode só contribuir com isso. Tem que contribuir com mais. Estou precisando’”.
O tesoureiro queria R$ 20 milhões. Pessoa ofereceu R$ 5 milhões no primeiro turno e mais R$ 5 milhões no segundo turno. Mas foram pagos R$ 7,5 milhões. Em delação premiada, Otavio Azevedo, da Andrade Gutierrez, também disse que Edinho Silva o pressionou para doar além do combinado. Pressionado, o executivo transferiu mais R$ 10 milhões para o caixa da petista. O total de doação declarada da empresa à campanha dela foi de R$ 20 milhões.

ELA SABIA Segundo Cerveró, Dilma teve acesso a todas as informações sobre Pasadena
ELA SABIA
Segundo Cerveró, Dilma teve acesso a todas as informações sobre Pasadena (Crédito:Jefferson Rudy/Agência Senado)

“Dilma mentiu sobre Pasadena”

O ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró desmentiu versão da presidente afastada, Dilma Rousseff, sobre a compra da refinaria em Pasadena, nos Estados Unidos, em 2006. E disse também supor que ela sabia do esquema de pagamento de propinas a políticos com dinheiro da petroleira. Em sua delação premiada tornada pública na quinta-feira 2 consta que a petista, à época presidente do Conselho Administrativo da Petrobras, teve acesso a todas as informações e cláusulas do negócio bilionário que só causou prejuízos à estatal. “Não corresponde à realidade a afirmativa de Dilma Rousseff de que somente aprovou a aquisição porque não sabia dessas cláusulas.” E continuou: “Dilma Rousseff tinha todas as informações sobre a refinaria de Pasadena; que o Conselho de Administração não aprova temas com base em resumo executivo”.
O documento revela ainda “que o declarante supõe que Dilma Rousseff sabia que políticos do Partido dos Trabalhadores recebiam propina oriunda da Petrobras, que, no entanto, o declarante nunca tratou diretamente com Dilma, sobre o repasse de propina.”
Ele também destacou que a transação foi autorizado com muito mais rapidez do que o de costume. “O projeto foi aprovado na Diretoria Executiva da Petrobras numa quinta e na sexta o projeto foi aprovado no Conselho de Administração; que esse procedimento não era usual”, foi registrado pelos investigadores.
Quando já estava preso, Cerveró afirmou ter ouvido do advogado do ex-senador Delcídio do Amaral que Dilma atuaria para “cuidar dos meninos”, tirando Cerveró e o também ex-diretor da empresa Paulo Roberto Costa da cadeia. Além de Dilma, Cerveró revelou que, em 2000, houve orientação da cúpula da Petrobras para contratar a empresa de PRS Energia, de Paulo Henrique Cardoso, filho do então presidente da República Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

GILES É DILMA Segundo delação de Bené, Giles Azevedo pagou agência que atuou na campanha de Dilma com dinheiro público
GILES É DILMA Segundo delação de Bené, Giles Azevedo pagou agência que atuou na campanha de Dilma com dinheiro público (Crédito:Alan Marques/Folhapress)

Propina paga despesas pessoais

E-mails comprovam que Dilma sabia do Petrolão e teve despesas pagas com recursos do esquema. Segundo o jornal O GLOBO, as mensagens mostram que a compra de um teleprompter para a petista e até os custos do deslocamento de seu cabeleireiro, Celso Kamura, foram bancados por envolvidos nos desvios. Em entrevista à ISTOÉ em 2011, Kamura disse que o marqueteiro João Santana custeava os serviços dele à presidente “em ocasiões de Estado”. As novas evidências contra a petista não param por aí. Em delação, o empresário Benedito Oliveira, o Bené, revelou que Giles Azevedo, ex-chefe de gabinete de Dilma, firmou contratos do governo com agências para quitar despesas eleitorais. Conforme já havia revelado ISTOÉ, Giles era o braço-direito de Dilma para tarefas espinhosas. Não fazia nada sem seu conhecimento. Como quando indicou para Danielle Fonteles, da Pepper, contas para receber caixa dois de campanha