O delator Luiz Eduardo
Soares, um dos responsáveis pelo Setor de Operações Estruturadas da
Odebrecht, confirmou em depoimento à Justiça Eleitoral os codinomes usados
para identificar o pagamento de propina ao ex-governador do Rio Sérgio Cabral e
ao deputado cassado Eduardo Cunha. Ele confirmou que Cabral era identificado
como "Proximus" e Cunha recebia o apelido de "Caranguejo".
Investigadores acreditam que o codinome de Cabral seria uma referência à sua
proximidade com o ex-presidente Lula, e o apelido de Cunha tem a ver com seu
jeito desengonçado de caminhar.
A alcunha do deputado
cassado e ex-presidente da Câmara já tinha aparecido no anexo de delação do
executivo Cláudio Melo Filho, que veio a público em dezembro do ano passado. O
apelido de Cabral aparece em materiais da Polícia Federal. Em relatório de
busca e apreensão, a PF aponta em planilhas que a alcunha "Proximus"
é vinculada a dois pagamentos no Rio, de R$ 500 mil cada. Anotações fazem
menção à Linha 4-Oeste do Metrô.
Em outro relatório, a PF
registra e-mails no qual o codinome está atrelado a repasse de valores, a
partir de material apreendido com o ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura
Benedicto Júnior, o BJ. Em mensagem trocada entre Hilberto Silva, Benedicto
Júnior, Lúcia Tavares, João Borba Filho e Luiz Eduardo Soares, de 17 de
fevereiro de 2007, o assunto é a liquidação "Proximus".
Na conversa, a secretária
Lúcia Tavares pede para que Benedicto e Borba façam a liquidação com
"Proximus", no valor de R$ 1 milhão, indica que a transação deve
ocorrer sob a senha "Tomate" e dá endereço no Rio onde os valores
devem ser entregues. No local, a secretária do "setor de propinas"
afirma que o interlocutor a ser procurado responde por "Orelha".
Em outro e-mail, de 11 de
janeiro de 2008, trocado entre Marcelo Odebrecht, BJ e Ubiraci Santos, os
executivos falam sobre o assunto "Programa Social RJ". Na conversa,
BJ pede autorização a Odebrecht para liberar porcentagens de pagamentos relacionados
ao programa. Do valor do contrato, que seria de R$ 495 milhões, BJ indica que
Proximus ficaria com 5%.
Soares foi chamado para
depor na ação que investiga abuso de poder político e econômico na campanha de
reeleição de Dilma Rousseff (PT), em 2014. No depoimento ao ministro Herman
Benjamin, relator do caso no TSE, ele diz que não participou de operações em
2014 porque saiu do "setor de propinas" no mesmo ano.
Cabral movimentou propina em 15 contas de sete
países, diz MPF
Ex-governador é acusado de ter
recebido US$ 3 milhões da Odebrecht em Andorra
A nova denúncia aceita
pela Justiça Federal traz mais uma frente de investigação: o recebimento e a
lavagem de dinheiro oriundos da Odebrecht — foram descobertos US$ 3 milhões
destinados ao ex-governador, depositados em banco de Andorra. Até então, as
implicações de Cabral com a Justiça estavam relacionadas com propinas cobradas
a partir de obras da Andrade Gutierrez e da Carioca Engenharia, reveladas por
executivos das duas empreiteiras em acordos de delação premiada.
Com auxílio de um grupo
de doleiros, o ex-governador montou uma rede bancária com postos em paraísos
fiscais tradicionais — Suíça, Bahamas, Mônaco e Luxemburgo —, além de Nova
York, nos Estados Unidos, na Holanda e em Andorra. De acordo com o Ministério Público
Federal (MPF), as remessas de dinheiro para o exterior aconteceram entre 2003,
quando Cabral era senador, até 2015, quando já havia deixado o governo do Rio
em benefício de seu vice, Luiz Fernando Pezão (PMDB). A investigação recuperou
US$ 85 milhões (R$ 269,4 milhões, na cotação de ontem), valor que já está
disponível na conta judicial e pode ser pleiteado pelo governo, afundado em uma
crise financeira.
ENTENDA
O QUE PESA CONTRA SÉRGIO CABRAL
O MPF sustenta que
Cabral, preso desde novembro, cometeu o crime de lavagem de dinheiro 30 vezes,
praticou evasão de divisas 25 vezes e, em nove ocasiões, incorreu em corrupção
passiva. O ex-secretário de Governo Wilson Carlos e Carlos Miranda, apontados
como operadores financeiros, também viraram réus por lavagem de dinheiro e
evasão de divisas, enquanto Sérgio Castro de Oliveira, o Serjão, outro
integrante do esquema, vai responder por evasão de divisas.
“O vultuoso volume de
recursos obtidos em razão dos crimes praticados pelo grupo criminoso exigia uma
forte estrutura destinada à movimentação e lavagem do dinheiro da propina,
razão pela qual uma série de agentes passaram a integrar a organização
criminosa com tal finalidade, realizando, na divisão de tarefas da organização,
a função de operadores financeiros”, escreveram os procuradores.
NOVOS
PERSONAGENS
A força-tarefa da
Lava-Jato destrinchou o papel de novos personagens: os doleiros Vinicius
Claret, o Juca Bala, e Claudio Fernando Barboza de Souza, sócios no Uruguai,
onde foram presos na semana passada. Eles se tornaram réus por organização
criminosa, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e corrupção passiva. A dupla
passou a ser solicitada para esconder os valores de origem ilícita quando os
doleiros Renato e Marcelo Chebar, que estão colaborando com a investigação, não
tiveram mais capacidade de lidar sozinhos com o esquema, em função do aumento
dos recursos.
Juca Bala tornou-se uma
das pontes do esquema de Cabral com o departamento de propinas da Odebrecht. De
acordo com o doleiro Enrico Machado, que também firmou acordo de delação
premiada, como O GLOBO antecipou, a construtora era uma das “principais
clientes” de Juca Bala, correspondendo a 60% de toda a movimentação financeira
que ele comandava. No Rio, ele mantinha salas comerciais com cofres para
guardar o dinheiro.
Outro nome que ainda não
tinha vindo à tona é o de Timothy Scorah Lynn, que virou réu. Ele atuava como
procurador de offshores criadas pela Odebrecht para destinar propina a agentes
políticos e atuou como intermediário do pagamento dos US$ 3 milhões. Um
contrato de serviço fictício de consultoria foi firmado entre uma empresa pela
qual ele respondia e uma companhia de Renato Chebar. Desta forma, os recursos
circularam da empreiteira para o ex-governador. A participação de Timothy foi
reiterada por outro delator da Lava-Jato: Vinicius Borin, operador de offshores
da Odebrecht.
O advogado de Carlos
Miranda afirmou que a denuncia trata de "fatos que em parte eram já
conhecidos", que constituiriam "uma unidade artificialmente
fracionada". "Acreditamos que no curso da ação penal será esclarecida
a responsabilidade de Carlos Miranda", diz a nota.
A defesa de Wilson Carlos
afirmou que não vai se pronunciar. Os advogados de Cabral não retornaram as
ligações. Os defensores dos outros réus não foram encontrados.