Ex-presidente supostamente recebeu R$ 1 milhão disfarçado de
doação por intermediar negócios de empresa no país africano, diz MPF; Instituto
Lula diz que doações são legais; defesa afirma que denúncia 'é mais um duro
golpe no Estado de Direito'.
A Força Tarefa da
Operação Lava Jato em São Paulo denunciou nesta segunda-feira (26) o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pelo crime de lavagem de dinheiro
por supostamente ter recebido R$ 1 milhão para intermediar discussões entre o
governo de Guiné Equatorial e o grupo brasileiro ARG para a instalação da
empresa no país.
Segundo o Ministério
Público Federal (MPF), Lula recebeu a quantia dissimulada em forma de uma
doação da empresa ao Instituto Lula, entre setembro de 2011 e junho de 2012.
O advogado do
ex-presidente, Cristiano Zanin Martins, afirma em nota que a nova denúncia “é
mais um duro golpe no Estado de Direito porque subverte a lei e os fatos para
fabricar uma acusação e dar continuidade a uma perseguição política sem
precedentes pela via judicial” (leia mais abaixo).
Em nota, a assessoria de
imprensa do Instituto Lula afirma que todas as doações recebidas por ela "são
legais, declaradas, registradas, pagaram os impostos devidos". Ainda de
acordo com o comunicado, as doações "foram usadas nas atividades fim do
Instituto e nunca tiveram nenhum tipo de contrapartida".´
Lula é denunciado pela força tarefa da Operação Lava Jato em São Paulo
Lula está preso na sede
da Polícia Federal em Curitiba, no Paraná, condenado a 12 anos de prisão por lavagem de dinheiro e corrupção no caso
do triplex no Guarujá (SP).
Além de Lula, o MPF
denunciou ainda o controlador do grupo ARG, Rodolfo Giannetti Geo, pelos crimes
de tráfico de influência em transação comercial internacional e lavagem de
dinheiro. Como Lula tem mais de 70 anos, o crime de tráfico de influência
prescreveu em relação a ele.
As negociações começaram
entre setembro e outubro de 2011. Segundo o MPF, Geo pediu a Lula para que
interviesse junto ao presidente da Guiné Equatorial, Obiang Nguema Mbasogo,
para que o governo continuasse realizando transações comerciais com a ARG,
especialmente na construção de rodovias.
Carta de Lula para
presidente da guiné Equatorial — Foto: Reprodução/Ministério Público Federal
Provas
O MPF dizer que conseguiu
provar a transação com base em e-mails encontrados em computadores no Instituto
Lula, apreendidos em março de 2016 na
Operação Aletheia, 24ª fase da Operação Lava Jato de Curitiba.
Em e-mail de 5 de outubro
de 2011, o ex-ministro do Desenvolvimento do governo Lula Miguel Jorge,
escreveu para Clara Ant, diretora do Instituto Lula, que o ex-presidente havia
dito a ele que gostaria de falar com Geo sobre o trabalho da empresa na Guiné
Equatorial. Segundo o ex-ministro informava no e-mail, a empresa estava
disposta a fazer uma contribuição financeira “bastante importante” ao Instituto
Lula.
Em maio de 2012, Geo
encaminhou a Clara Ant por e-mail uma carta digitalizada de Teodoro Obiang para
Lula e pede para que seja agendada uma data para encontrar o ex-presidente e
lhe entregar a original. Também informa à diretora do instituto que voltaria à
Guiné Equatorial em 20 de maio e que gostaria de levar a resposta de Lula.
Lula escreveu uma carta a
Obiang em que mencionava um telefonema entre ambos e que acreditava que o país
poderia ingressar, futuramente, na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
A carta foi entregue em mãos ao presidente da Guiné Equatorial por Rodolfo Geo.
Na carta, Lula diz a
Obiang que Geo dirige a Arg, “empresa que já desde 2007 se familiarizou com a
Guiné Equatorial, destacando-se na construção de estradas”.
Na análise dos dados
apreendidos no Instituto Lula foi localizado registro da transferência bancária
de R$ 1 milhão pela ARG ao instituto em 18 de junho de 2016. Recibo emitido
pela instituição na mesma data e também apreendido registra a “doação”.
Para o MPF, não se trata
de doação, mas pagamento de vantagem a Lula em virtude do ex-presidente do
Brasil ter influenciado o presidente de outro país no exercício de sua função.
Como a doação feita pela ARG seria um pagamento, o registro do valor como uma
doação é ideologicamente falso e trata-se apenas de uma dissimulação da origem
do dinheiro ilícito, e, portanto, configura crime de lavagem de dinheiro.
Um dos sócios do grupo,
pai do denunciado, Adolfo Geo morreu
em um acidente de avião nesta segunda-feira em Minas Gerais.
Adolfo não tinha sido denunciado.
O caso envolvendo o
Instituto Lula foi remetido à Justiça Federal de São Paulo por ordem do então
titular da Operação Lava Jato, Sergio Moro. O inquérito tramita na 2ª Vara
Federal de São Paulo, especializada em crimes financeiros e lavagem de
dinheiro, que analisará a denúncia do MPF.
Defesa de Lula
Segundo a defesa de Lula,
a nova denúncia “é mais um capítulo do ‘lawfare’ que vem sendo imposto a Lula
desde 2016”. “A denúncia pretendeu, de forma absurda e injurídica, transformar
uma doação recebida de uma empresa privada pelo Instituto Lula, devidamente
contabilizada e declarada às autoridades, em tráfico internacional de
influência (CP, art. 337-C) e lavagem de dinheiro (Lei n. 9.613/98, art 1º.
VIII)”, disse Zanim Martins.
“A acusação foi
construída com base na retórica, sem apoio em qualquer conduta específica
praticada pelo ex-presidente Lula, que sequer teve a oportunidade de prestar
qualquer esclarecimento sobre a versão da denúncia antes do espetáculo que mais
uma vez acompanha uma iniciativa do Ministério Público – aniquilando as
garantias constitucionais da presunção de inocência e do devido processo
legal”, acrescentou.
O advogado finaliza a nota
dizendo esperar que “a Justiça Federal de São Paulo rejeite a denúncia diante
da manifesta ausência de justa causa para a abertura de uma nova ação penal
frívola contra Lula”.
Comprovante
de doação deito pela ARG para o Instituto Lula — Foto: Reprodução/MPF
Delegação investigada
Outro caso envolvendo a
Guiné Equatorial ocorreu em setembro. No dia 14 daquele mês, agentes da Receita
Federal e da Polícia Federal (PF) apreenderam
US$ 1,4 milhão e R$ 55 mil em dinheiro, e cerca de 20 relógios
avaliados em US$ 15 milhões com membros de uma comitiva do país no Aeroporto
Internacional de Viracopos, em Campinas. O vice-presidente do país, Teodoro
Obiang Mang, estava no voo.
Conhecido como Teodorín,
ele é o filho mais velho do presidente da Guiné Equatorial. A PF
quer descobrir com quem a comitiva iria se encontrar durante estada no Brasil.
A fortuna estava em duas malas não diplomáticas da delegação.
Em depoimento à Polícia
Federal, o secretário da Embaixada da Guiné Equatorial, Leminio Akuben Mikue,
explicou que o vice-presidente veio ao Brasil para tratamento médico, e que o
US$ 1,4 milhão em uma das malas seria utilizado em missão oficial posterior,
com destino a Singapura. Sobre os relógios, o secretário informou que seriam de
uso pessoal de Teodoro Obiang Mang.
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