Ação do narcotráfico mirava esposa e filha de Moro
ALLAN DOS SANTOS - 26 DE MARÇO
Após facada em
Bolsonaro, que nunca teve uma investigação decente e com resultados plausíveis,
nenhum planejamento criminoso foi tão grave na república brasileira na última
década como a tentativa de sequestro de Moro.
A Polícia Federal
afirma no pedido de prisão enviado à Justiça Federal que o plano de ataque do
PCC (Primeiro Comando da Capital) contra o ex-ministro e atual senador era
iminente, e que a facção monitorou locais onde Moro frequentava.
O clube em Curitiba
onde Moro votou na eleição de 2022 era um dos locais monitorados. As
informações foram utilizadas como base na Operação Sequaz, deflagrada na última
quarta-feira (22).
Um depoimento abriu a caixa de Pandora
A apuração dos
investigadores iniciou-se com base em depoimento de um ex-membro do PCC, o qual
se transformou em testemunha protegida da Justiça de São Paulo.
O ex-membro relatou
o plano de sequestro do ex-ministro, posteriormente levado aos investigadores
da PF. Na quarta-feira última, 11 mandados de prisão e uma série de diligências
foram realizados para desarticular a ação que estaria em andamento para atacar
autoridades.
Plano do PCC começou em ano eleitoral
Segundo a Polícia
Federal, a quadrilha chegou a fazer um reconhecimento detalhado do local de
votação de Moro. Esse levantamento incluía descrição das entradas, câmeras
existentes no local e rota de acesso. A investigação também encontrou imagens
do prédio onde o senador vivia no Paraná no celular de um dos investigados.
Segundo a PF, o plano do PCC estava em andamento desde fevereiro do ano
passado, ou seja, em pleno ano eleitoral. A execução do plano teria desfecho
iminente.
O organizador do plano criminoso
Conhecido como
Nefo, NF ou Dodge, Janeferson é apontado pela PF como responsável pela
“organização, financiamento, planejamento e execução do sequestro/atentado”
contra Moro.
Ele seria um
integrante da Restrita 05, célula da cúpula do PCC. Entre outras informações, a
PF mapeou como ele participou do aluguel de imóveis em Curitiba durante a
execução do plano.
Uma dessas casas
estava localizada entre o escritório de advocacia da deputada federal Rosângela
Moro (União Brasil - SP), esposa do senador, e um antigo imóvel da família
perto da residência atual.
“Corroborando a
iminência do plano, o principal investigado, de nome Janeferson, e sua
companheira de nome Aline Lima Paixão realizaram mudança de residência no
início do mês de fevereiro, buscando cadastrar todos os da- dos em nome de
terceiros, notoriamente para tentarem ficar invisíveis quando do cometimento
dos gravíssimos delitos”, diz a PF.
As anotações do PCC
apontam que o plano para sequestrar o senador previa custos de ao menos R$
564,5 mil. As despesas envolveriam R$ 110 mil em fuzis e R$ 90 mil em dois
carros, entre outros itens.
A decisão da juíza que autorizou a operação
Na decisão que
autorizou a operação, a juíza Gabriela Hardt cita que a “capacidade bélica dos
criminosos é notória, tendo sido obtidos diversos registros fotográficos de
armas variadas — dentro de casas, sob móveis, indicando que efetivamente estão
prontas para uso da organização”.
Entre os veículos
que seriam usados na empreitada criminosa estava uma Mercedes blindada, aponta
o inquérito.
Em uma anotação,
havia o controle desses gastos como “apartamento, viagem, alimentação,
combustível, aluguel de chácara, móveis para casa, veículos (Hilux), pedreiro
para cofre (esconderijo para armas)”, entre outros.
Outra anotação
encontrada tinha informações pessoais do senador, como endereços, nome dos
familiares, telefone, e-mail da sua filha e declaração de bens.
Moro entrou na mira do PCC por ações na gestão Bolsonaro
Um dos motivos para
o ataque da facção seria a portaria assinada pelo ex-juiz, quando ele era
ministro da Justiça, que manteve a rigidez no sistema penitenciário federal.
O documento foi
assinado no mesmo dia em que chefes da facção foram transferidos de São Paulo
para presídios federais, em fevereiro de 2019.
Moro foi ministro
da Justiça do governo Bolsonaro, de janeiro de 2019 a abril de 2020.
Os motivos, porém,
ainda são alvo de análise por parte de integrantes das forças de segurança de
São Paulo. Isso porque, até o final de 2022, o nome do senador pela União
Brasil não constava em lista dos serviços de inteligência paulista sobre “os
decretados”.
Isso enfraquece a
tese de que ele poderia ter entrado na mira da facção criminosa por ter
participado da transferência de presos ao sistema federal em 2019.
Segundo o promotor
Lincoln Gakiya, Moro se tornou alvo do PCC após proibir visitas íntimas aos
presos no sistema federal. “Moro é alvo destes criminosos por conta da portaria
que ele baixou proibindo as visitas íntimas no sistema penitenciário federal.
Isso realmente desagradou esses criminosos, não só do PCC, mas de todas as
facções”, afirma.
Qual seria a origem
desse suposto plano de ataque? Integrantes do Ministério Público de São Paulo
envolvidos na ação da quarta afirmam que o plano de ataque contra autoridades
seria um desdobramento da ação investigada pela PF que resultou na Operação
Anjos da Guarda, no final do ano, que teria desmantelado um suposto plano de
resgate de chefes presos nas penitenciárias federais.
Como não
conseguiram resgatar Marco Willians Herbas Camacho, conhecido como Marcola, o
principal objetivo do “plano A”, tentariam um “plano B”: atacariam e seques-
trariam autoridades como forma de conseguir liberá-lo em uma “troca de reféns”.
Quem é o promotor na mira do PCC?
Um dos alvos do
suposto plano de ataques do PCC contra autoridades brasileiras, o promotor
paulista Lincoln Gakiya está no topo de uma lista de sentenciados à morte pela
facção, os chamados “decretados”, segundo os serviços de inteligência do
Governo de São Paulo.
Coordenador do
principal grupo do Ministério Público de combate ao crime organizado, Gakiya
assumiu esse posto em 2018, quando assinou pedidos de transferência de
integrantes da cúpula da facção ao sistema federal —entre eles o de Marcola,
apontado como principal chefe do grupo.
Antes mesmo de o
pedido ser acatado pelo Judiciário, os órgãos de inteligência do governo
paulista detectaram a fúria de criminosos contra o promotor. Isso ficou
materializado em carta apreendida naquele ano com uma ordem da cúpula para
matá-lo.
A ilação criminosa de Lula sobre a operação da Polícia Federal
Lula fez uma
ilação. Na quinta (23), disse achar ser “uma armação” do senador Moro o plano
do PCC descrito pela Polícia Federal para atacar o ex-juiz. “Quero ser
cauteloso, vou descobrir o que aconteceu. É visível que é uma armação do Moro”,
disse o presidente.
Alckmin aparece discordando de Lula
A operação da PF
dividiu o governo. Enquanto Lula e alguns assessores próximos acirraram a
disputa com opositores ao sugerir, sem provas, “uma armação” de Moro no caso,
outros aliados lamentaram a declaração do presidente e iniciaram tentativa de
corrigir o discurso oficial.
Na avaliação deles,
a fala de Lula fortalece Moro e recoloca o senador na posição de antagonista do
ditador socialista — em um início de legislatura no Senado em que ele tinha uma
atuação apagada.
Horas após a
declaração do petista, o vice Geraldo Alckmin (PSB) publicou vídeo em redes
sociais fazendo questão de exaltar investigação da PF e do Ministério Público e
dizendo que a organização criminosa tinha “graves planos contra a democracia”,
sem citar o nome da organização: PCC.
A ilação de Lula poderia ser motivo de impeachment
Sem nenhuma prova,
parte de seu entorno tem levantado dúvidas em reuniões privadas sobre o caso.
Integrantes do
Planalto apontavam haver coincidência no fato de a operação ter sido deflagrada
um dia após Lula dizer em entrevista que queria “foder esse Moro”; e que a
juíza responsável pelo caso era Gabriela Hardt, que atuou junto com o próprio
Moro nos processos da Lava Jato.
A versão alardeada
por palacianos chegou a Dino e à PF, causando desconforto. O incômodo ocorreu
porque toda a investigação foi feita durante o governo Lula, na gestão de
Andrei Rodrigues como diretor-geral da corporação.
Quem é a juíza que ordenou as prisões?
Gabriela Hardt,
responsável pela ordem de prisão contra suspeitos de preparar um ataque contra
Moro, atuou por anos ao lado do hoje senador na 13ª Vara Federal de Curitiba.
Hardt inclusive
sentenciou casos da Operação Lava Jato, incluindo o processo sobre reformas
pagas por empreiteiras em um sítio frequentado pelo presidente Lula em Atibaia
(SP).
Ela despachou no
caso do PCC porque foi designada temporariamente para a 9ª Vara Federal de
Curitiba em razão de férias de outra magistrada. Ela assumiu o lugar na
terça-feira (21).
A juíza autorizou o
acesso às decisões e pedidos da Polícia Federal relacionados à investigação
sobre o plano do PCC pouco depois das declarações do presidente Lula sugerindo
“uma armação” de Moro no caso.
A Justiça Federal
do Paraná afirmou nesta sexta-feira (24) que o pedido para tirar o sigilo da
investigação sobre o plano contra autoridades partiu do delegado da Polícia
Federal responsável pelo caso.
A juíza autorizou na quinta-feira que a área de comunicação da Justiça Federal envias- se aos órgãos de imprensa que solicitassem os pedidos policiais e as decisões sobre prisões e buscas.
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