Operador trocou mensagens com o governador
RIO - A Polícia Federal
afirma em um relatório, datado de 6 de junho, que foram verificadas
"algumas informações que podem servir de elementos probatórios que
vinculam o governador Luiz Fernando Pezão a integrantes da organização
criminosa chefiada pelo ex-governador Sérgio Cabral". A afirmação da PF
está no documento relativo à perícia feita no celular de Luiz Carlos Bezerra,
apontado como operador de Cabral.
A relação de
proximidade entre Pezão e Bezerra é listada pela PF por meio de mensagens
trocadas pelo operador com o próprio governador. No dia 29 de março do ano
passado, Bezerra escreve a Pezão, a quem chama de "Pezzone", para
desejar feliz aniversário.
"Querido amigo e
Exmo Governador Pezzone. Parabéns e felicidades 1000 pelo seu aniversário, que
iremos comemorar muitos outros adiante, não tenho a menor dúvida", escreve
Bezerra. "Vamos juntos amigo, a gente até enverga, mas não quebra nem a
kraio!!!!" (sic), concluiu.
O operador enviou uma
mensagem ao governador dias antes, em 19 de março, quando Pezão estava
internado pouco antes de ser diagnosticado com câncer. No texto, Bezerra deseja
a recuperação do governador para eles comemorarem "com essas loiras".
"Querido amigo,
acompanhando e recebendo notícias suas pelo amigo em comum. Aguardamos sua
saída o mais rápido possível para comemorarmos sua completa recuperação com
essas loiras!!! Heheheh. Estamos juntos meu camarada!!! Forever!!!",
escreveu o operador, enviando duas imagens, não detalhadas no relatório da PF,
ao governador.
"Assim vc me mata,
isso ¿ sacanagem, obrigado pelo carinho", respondeu Pezão.
Para a PF, o diálogo
revela uma relação bastante próxima entre o operador e o governador.
Reprodução
de uma mensagem enviada por Bezerra a Pezão -
.
Em uma outra mensagem a Pezão, enviada em novembro de 2015, Bezerra elogia o
atendimento de um posto do Detran e conclui: "Digo isso como um
contribuinte como todos e não como o amigo que tem oportunidade de estar
próximo do Exmo Gov. e beber umas "geladas", o que, diga-se de
passagem, tô sentindo falta... hehehe... abração meu irmão...".
PEZÃO NEGA TER RECEBIDO PROPINA
Em uma imagem que
consta no relatório, aparece a anotação "PeZao galo 2a falar felipe".
A PF analisou o conteúdo, de 30 de novembro de 2013, e concluiu: "Pezão
possivelmente receberá Galo na segunda (galo, no ditado popular, significa 50,
para o trecho em análise, R$ 50.000 (cinquenta mil reais))". Procurado
para comentar o relatório da PF, o governador reafirmou, por meio de sua assessoria,
que nunca recebeu recursos ilícitos e que continua à disposição da Justiça para
quaisquer esclarecimentos.
Essa não é a primeira
referência que um relatório da PF faz de pagamento de propina a Pezão. Como O
GLOBO publicou em fevereiro, o nome do
governador consta em anotações manuscritas encontradas durante a busca e
apreensão na casa de Bezerra. De acordo com a PF, Pezão estaria
ligado a repasses de propina de R$ 140 mil e um outro de R$ 50 mil. Como Pezão
tem foro privilegiado, as informações foram remetidas ao Superior Tribunal de
Justiça (STJ). O relatório de 6 de junho foi remetido pela PF ao juiz Marcelo
Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, com a recomendação de que a investigação
seja remetida ao STJ.
Outra reportagem do
GLOBO mostrou que o secretário de Governo do Rio, Affonso
Monnerat, homem da estrita confiança do governador, aparece nas mesmas
anotações encontradas na casa de Bezerra. De acordo com
investigadores, a inscrição “Monerá” nas anotações do operador diz respeito ao
secretário de Pezão. Nos papéis, “Monerá” está relacionado a anotações de
“20.000”, o que significa R$ 20 mil. Segundo relatório da Polícia Federal, é
uma possível referência ao repasse de propina ao secretário.
Em outro caso, o advogado
Jonas Lopes Neto, filho do ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio
(TCE-RJ) Jonas Lopes, afirmou em delação premiada que o subsecretário de Comunicação do governo do Rio,
Marcelo Santos Amorim, contou a ele ter pago R$ 900 mil em despesas pessoais do
governador com recursos oriundos de corrupção. Os valores
viriam de empresas da área de alimentação que mantinham contratos com o estado.
DELATORES DA ODEBRECHT
Dois delatores da
Odebrecht já haviam relatado que o governador recebeu propina da empresa. O
dinheiro teria sido repassado de duas maneiras — entregue pessoalmente e
depositado em contas no exterior — e registrado na contabilidade paralela da
empresa.
O relatório da PF de 6
de junho lista ainda duas informações sobre Pezão. No dia 29 de dezembro de
2015, Bezerra envia uma mensagem para Cabral: "Pezzone tá na área e já
perguntou por vosmicê... ok?". Para a PF, o conteúdo demonstra, "mais
uma vez, a relação entre Cabral, Bezerra e Pezão".
No dia seguinte,
Bezerra escreve uma mensagem ao irmão de Cabral, Maurício, pedindo que ele se
apressasse porque Pezão havia chegado ao que a PF descreve como "um
possível encontro entre os integrantes da organização criminosa".
"Maluco, Pezzone
já chegou aqui. Vem com tudo", escreveu o operador.
"Chegando",
respondeu Maurício.
Em nota, a defesa de
Maurício Cabral afirmou que o cliente nunca participou de qualquer organização
criminosa. "O encontro referido no relatório da polícia federal teve a
natureza de confraternização social de festas de final de ano em
Mangaratiba", diz a nota assinada pelos advogados Fernanda Freixinho e
Daniel Raizman.
Além das mensagens, um
áudio é apontado pela PF como mais um indício do vínculo entre Pezão e Bezerra.
Um sócio do operador, Bruno Guedes, ao fazer uma reclamação, em 6 de outubro de
2015, a Bezerra, diz: "Você tem influência dos amigos Cabral e Pezão e eu
sou apenas um sommelier".
O operador respondeu:
"E vamos deixar bem claro de uma vez, se conheço fulano, beltrano ou qq
pessoa que vc venha a mencionar, não é problema seu, ok?".
Mesmo sem fazer
delação, Bezerra passou a colaborar com os investigadores nos últimos meses.
Ele apontou quem eram os nomes por trás de alguns apelidos usados por ele em
suas anotações, o que tem sido usado pela força-tarefa da Lava-Jato no Rio para
fazer novas denúncias. Bezerra é réu confesso e foi preso em novembro do ano
passado, na Operação Calicute, a mesma que prendeu Cabral.
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