VICE
O PROCESSO POPULAR CONSTITUINTE DA VENEZUELA
22.6.17    

ANDRÉ DE PAULA -
A solução para superação desta situação está mais uma vez (e já foram muitas) em consultar o povo e dar-lhe mais poder.
A Venezuela está em guerra não convencional. Manifestações violentas têm sido patrocinadas pela direita através de um exército mercenário, causando dezenas de mortes e perdas milionárias nas diversas estruturas do Estado.
A direita esconde alimentos para que o povo passe fome e se revolte. A grande imprensa culpa o governo e inocenta a oposição, invertendo escandalosamente os fatos.
Qual a causa de tais acontecimentos? A resposta é que os poderosos vêm perdendo seus privilégios desde o governo Chávez. A solução para superação desta situação está mais uma vez (e já foram muitas) em consultar o povo e dar-lhe mais poder.
Maduro faz a convocação da Constituinte baseado nos artigos 347 e 348 da Constituição. Todos os setores do país terão nela participação ativa, inclusive a oposição.
Trabalhadores, camponeses, indígenas, idosos, estudantes e deficientes físicos, entre outros, poderão ingressar no Parlamento, reforçando, com isso, o poder popular, independentemente de serem filiados a partidos. É o reconhecimento dos conselhos comunais, entre outras organizações de base territorial e social.
Com isso, constitucionalizam-se as metas que possibilitaram ao povo mais pobre atendimento médico gratuito no mesmo bairro em que mora; direito ao estudo desde o primário até a universidade; aprimorando a democracia popular e a produção.
A expectativa é alcançar a paz através de mais esta consulta para o aperfeiçoamento do sistema econômico nacional misto, produtivo e diversificado.
Tem-se, ainda, os objetivos de ampliar a competência da Justiça para erradicar a impunidade dos delitos cometidos pela direita criminosa, que, inclusive, queimou, entre outros, um rapaz chavista; e a defesa da soberania, da integridade da nação e amparo contra o intervencionismo estrangeiro.
Afirma-se, assim, o caráter pluricultural da pátria de Bolívar. As grandes potências apoiam governos das elites, mas não toleram um país independente que defende os seus recursos através da democracia popular.
O povo também está armado através dos grupos bolivarianos para defender a soberania do país. Se Lula e Dilma tivessem feito o que fez Chávez e o que faz Maduro não teriam caído.

* André de Paula é advogado da FIST e membro da Anistia Internacional. Fonte: O Dia

VERSA

CUBA, UMA REVOLUÇÃO DECRÉPITA E RABUGENTA

PERCIVAL PUGGINA

Em 1959, meus pais vieram morar em Porto Alegre. Aqui estavam as universidades e os melhores colégios públicos que para elas preparavam seus alunos. No topo da lista, o Colégio Estadual Júlio de Castilhos e seus excelentes professores. Por ali passaríamos os sete irmãos, cada um ao seu tempo. Era impossível, na efervescência intelecto-hormonal e no dinamismo da política estudantil dos anos 60, ficar imune aos debates e às disputas  entre as distintas e "sólidas" convicções dos adolescentes às voltas com suas espinhas. Foi nesse ambiente que ouvi, pela primeira vez, afirmações que repercutiriam através de sucessivas gerações de brasileiros: nosso país, a exemplo de outros, era subdesenvolvido por causa do imperialismo norte-americano, do capitalismo, da ganância empresarial e da remessa de lucros para o estrangeiro. Desapropriação e nacionalização compunham palavras de ordem e o fogoso Leonel Brizola se encarregava de agitar a moçada com inflamados discursos a respeito.
Para proporcionar ainda mais calor àquela lareira ideológica, Fidel Castro, montado num tanque, passara por cima dos supostos males causados pela burguesia e - dizia-se - colocava Cuba no limiar do paraíso terrestre. Derrubara uma ditadura e implantava o comunismo na ilha. Cá em Porto Alegre, nos corredores do Julinho, os mais eufóricos desfilavam entoando "Sabãozinho, sabãozinho, de burguês gordinho! Toda vil reação vai virar sabão!". A efervescência tinha, mesmo, incontidas causas hormonais.
Em meados de 2015, o New York Times publicou matéria repercutida pelo O Globo sobre as expropriações e nacionalizações promovidas pela revolução cubana em seus primeiros três anos. Menciona vários contenciosos que se prolongam desde então, envolvendo, entre outros, o governo espanhol, uma entidade representativa dos interesses dos cidadãos espanhóis, os Estados Unidos, bem como empresas e cidadãos norte-americanos e cubanos. Todos tiveram seus haveres confiscados, expropriados e, em muitos casos, surrupiados por agentes públicos. Ao todo, dois milhões de pessoas abandonaram a ilha, deixando para trás seus bens. Muitos, como a nonagenária Carmen Gómez Álvarez-Varcácel, que falou ao NYT por ocasião dessa reportagem, tiveram tomadas as joias de família que levavam no momento em que abandonavam o país. Segundo a justiça revolucionária, tudo era produto de lucro privado e merecia ser expropriado. Quem, sendo contra, escapasse ao paredón, já estava no lucro. Um estudo da Universidade de Creighton fala em perdas de US$ 6 bilhões por parte de cidadãos norte-americanos. As pretensões espanholas chegariam a US$ 20 bilhões.
No discurso da esquerda daqueles anos, e que se reproduz através das gerações, Cuba, tinha, então, o paraíso ao seu dispor. Sem necessidade de despender um centavo sequer, o Estado herdou todo o patrimônio produtivo, tecnológico e não produtivo de empresas privadas e de milhões de cidadãos. Libertou-se a ilha da dita exploração capitalista. O grande vilão ianque foi banido de seu território. Extinguira-se, de uma só vez e por completo, a remessa de lucros. A maldosa burguesia trocara os anéis pelos dedos.Tudo que o discurso exigia estava servido de modo expresso, simultâneo, no mesmo carrinho de chá.
Cuba, no entanto, mergulhou na miséria, no racionamento, na opressão da mais longa ditadura da América, na perseguição a homossexuais, na discriminação racial e na concessão a estrangeiros de direitos que, desde então, recusa ao seu povo. Por outro lado, enquanto, em nome da autonomia dos povos, brigava como Davi com bodoque soviético contra os Estados Unidos, treinava e subsidiava movimentos guerrilheiros centro e sul-americanos, e intervinha militarmente em países africanos a serviço da URSS.
O recente recuo político promovido por Trump nos entendimentos com a alta direção de Castro&Castro Cia. Ltda. leva em conta aspectos que foram desconsiderados por Obama e pelo Papa Francisco, tanto na política interna da ilha quanto nos contenciosos nascidos naqueles primeiros atos da revolução. Não posso ter certeza sobre quanto há de proteínas democráticas na corrente sanguínea de Trump animando essa decisão. Mas não tenho dúvida, porque recebo informações a respeito, que os milhões de cubanos na Flórida conhecem como ninguém a opressão política, a coletiva indigência, a generalizada escassez e a falta de alternativas que sombreia sucessivas gerações de seus parentes sob o jugo de uma revolução velha e velhaca, decrépita e rabugenta. E essa pressão política pesa muito por lá.

Percival Puggina, membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

Nenhum comentário:

Postar um comentário